Nobel de Fisiologia ou Medicina 2022: o que nos torna humanos únicos

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O Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina deste ano foi concedido à Svante Pääbo por seus estudos pioneiros da evolução humana. O pesquisador conseguiu obter e sequenciar material genético de ancestrais, e identificou uma espécie de hominídeos extinta: o Denisovano.

O trabalho fornece base para o estudo da biologia evolutiva, e para o entendimento da complexidade que é ser exclusivamente humano.

Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina 2022

Estudar como estamos relacionados com outras espécies extintas vai além de analisar apenas o DNA humano de hoje. Exige mais do que extrair e sequenciar um DNA, e a correlação com o material genético antigo parecia praticamente impossível. Logo, grande parte da inovação do trabalho que levou o Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina desse ano foi a técnica empregada.

Svante Pääbo teve que desenvolver formas de analisar o DNA que havia sido danificado por milhares de anos de exposição aos elementos e contaminado com sequências de microrganismos e humanos modernos.

Essa análise genética levou à descoberta de que neandertais e Homo sapiens trocaram material genético, e que 1-4% do genoma de humanos modernos descendentes de europeus e asiáticos pode ser rastreada até os neandertais.

As técnicas de Pääbo também foram usadas para identificar as origens de um osso de dedo de 40.000 anos encontrado em uma caverna do sul da Sibéria em 2008.

O DNA isolado do osso indicou que não era nem de neandertais nem de Homo sapiens, mas veio de um indivíduo pertencente a um novo grupo de hominídeos. Ou seja, foi possível sequenciar uma região do DNA de um outro ancestral humano extinto.

O grupo recebeu o nome de Denisovanos, em homenagem à caverna em que o osso foi encontrado. Os humanos antigos que viviam na Ásia também cruzaram com esse grupo, e o DNA Denisovano pode ser encontrado nos genomas de bilhões de pessoas vivas hoje.

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Relevância para a fisiologia humana

O estudo traz possibilidades para o estudo de variantes em genes arcaicos e suas associações com os fenótipos, e isso é visto pelos eventos de introgressão – introdução permanente de genes de uma espécie para outra.

Como os humanos arcaicos já estavam geneticamente adaptados para a vida em alguns dos ambientes (para os quais os humanos modernos migraram), estes eventos de introgressão de neandertais e denisovanos poderiam inserir novos alelos que impactaram de forma positiva na capacidade de sobrevivência à novos ambientes.

Tais sequências, que sofreram seleção positiva, podem fornecer informações funcionais sobre partes do nosso genoma, o que é de relevância geral para todos os seres humanos vivos.

De fato, isso foi rastreado, e ao avaliar como os genes fluíram entre as antigas populações, os pesquisadores identificaram origens de alguns aspectos da fisiologia humana moderna – como características do sistema imunológico e mecanismos de adaptação à vida em grandes altitudes.

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Um exemplo claro é a versão derivada de Denisova do gene da via de hipóxia (EPAS1), que confere uma vantagem genética à sobrevivência em altitude elevada e é encontrada nos tibetanos atuais.

Ou então um conjunto de genes que codificam três receptores do tipo Toll, TLR6-TLR1-TLR10, conhecidos por estarem envolvidos no reconhecimento microbiano e reações alérgicas. Regiões abrangendo estes genes estão presentes em frequências altas e diversas nas populações humanas atuais, sugerindo que eles fornecem efeitos biológicos favoráveis.

Alelos arcaicos podem até mesmo influenciar o risco de insuficiência respiratória durante a infecção por SARS-CoV-2, como foi visto em genes dos cromossomos 3 e 12.

Todos estes dados gerados a partir do desenvolvimento das técnicas de Pääbo sugerem que ainda há muito a ser aprendido sobre as consequências funcionais dos alelos introgredidos para nossa fisiologia.

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Imagem oficial © Nobel Prize Outreach, disponível aqui.

Biologia evolutiva: como chegamos aqui?

Como a maioria dos processos evolutivos, nossa história inicial é caracterizada por numerosas ramificações genéticas, muitas das quais não tiveram sucesso. Estima-se que o último ancestral comum dos macacos e grandes símios do Velho Mundo viveu há cerca de 25 milhões de anos e o de humanos e chimpanzés há cerca de 6 milhões de anos.

O gênero Homo evoluiu há cerca de 3 milhões de anos, com o Homo erectus entrando em cena há 1,8 milhão de anos, aventurando-se para além do continente africano e possibilitando a evolução de uma nova espécie, o Homo neanderthalensis, nossos parentes mais próximos.

Os neandertais habitaram a Europa e a Ásia de cerca de 400.000 a 30.000 anos atrás, quando foram extintos. Humanos anatomicamente modernos, com esqueletos como os dos humanos atuais, apareceram pela primeira vez na África há cerca de 300.000 anos.

Cerca de 60.000 a 70.000 anos atrás, a migração da África para o Oriente Médio levou a uma expansão do Homo sapiens pela Eurásia. Assim, o Homo sapiens coexistiu com os neandertais na Eurásia por pelo menos 20.000 anos. No entanto, a natureza de suas interações ainda é uma questão de debate.

Durante muito tempo, os estudos da evolução humana basearam-se em análises de restos ósseos antigos, suas características morfológicas e no exame de ferramentas e outros artefatos arqueológicos. Entretanto, tornou-se cada vez mais claro que a análise genética era necessária para esclarecer a relação entre nós e nossos parentes neandertais.

O trabalho de Pääbo estabeleceu que o Homo sapiens se misturou com neandertais e denisovanos durante períodos de coexistência, resultando na introgressão de DNA arcaico nos humanos atuais.

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Imagem do trabalho orifinal, disponível aqui.

Com essas descobertas, além do estudo do nosso passado evolutivo, podemos avançar na melhor compreensão das características genéticas que nos tornam exclusivamente humanos.

Referências:

Geneticist who unmasked lives of ancient humans wins medicine Nobel. Nature 610, 16-17 (2022). doi: https://doi.org/10.1038/d41586-022-03086-9

Advanced information. NobelPrize.org. Nobel Prize Outreach AB 2022. Thu. 10 Nov 2022. https://www.nobelprize.org/prizes/medicine/2022/advanced-information/

Li C, Li X, Xiao J, Liu J, Fan X, Fan F, Lei H. Genetic changes in the EPAS1 gene between Tibetan and Han ethnic groups and adaptation to the plateau hypoxic environment. PeerJ. 2019 Oct 28;7:e7943. doi: 10.7717/peerj.7943.

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