Intoxicação por Paracetamol: o que fazer?

paracetamol

A intoxicação por Paracetamol é uma das intoxicações mais frequentes na prática clínica. Ora, o paracetamol, além de ser amplamente receitado, é disponível nas farmácias sem a necessidade de receituário médico.

Nos EUA, cerca de 50% dos casos de insuficiência hepática aguda são devido a intoxicação por paracetamol.

Nesse artigo vamos abordar os principais tópicos envolvendo a intoxicação por paracetamol

O que é e qual é o mecanismo de ação do Paracetamol?

O Paracetamol, também conhecido como Acetaminofeno, é um analgésico e antipirético. Sua ação é através da inibição da cicloxigenase não seletivamente, reduzindo a formação de precursores de prostaglandinas e tromboxanos – o que cursa com efeito anti-inflamatório. Além disso, o paracetamol bloqueia a geração periférica do impulso da dor – sendo um bom analgésico.

É comercializado de forma genérica, e também sobre o nome de diversas marcas, sendo a mais conhecida o Tylenol®, e outras como: Emsgrip®, Trimedal D&F®, Acetofen®, Acetamil®, Acetilol®, Analgisen®, Cyfenol®, Dorfen®, Dorfenol®, Dorico®, Pacemol®, Paracen®, Paragen®, Paratermol®, Termol®, Pratium®, Tylaflex®, Tyneo®, Tyflen®, Tyflen Bebê®, Tyflen Criança®, Piramin®, Cimegripe 77C®, Dorsanol®, Cimegripe Bebê e Criança®, Unigrip®, Multigrip dor e febre®, Fervex®, Dorsanol®, FUNED Paracetamol®, FURP-Paracetamol®, Sonridor®, Vick Pirena®, Tylemax®, Tylemax Baby®, Tylemax Criança®

Como ocorre a intoxicação por Paracetamol?

A intoxicação por paracetamol ocorre devido a ingestão acidental e uso de dose elevada ou mesmo Tentativa de suicídio.

Em indivíduos saudáveis, quando ocorre a ingestão de Paracetamol (para um resfriado por exemplo), ele é rapidamente absorvido pelo trato gastrointestinal para ter sua ação terapêutica. Após isso, é metabolizado da seguinte forma:

  • 90% é metabolizado no fígado, transformando-se em conjugados sulfatados e glicuronídeos para então serem eliminados pela urina
  • Dos 10% restantes, metade é eliminado diretamente na urina, e a outra metade vai ser metabolizada pelo citocromo P450 (2E1) hepático, dando origem ao NADPQI – um composto bastante tóxico e reativo, o qual rapidamente conjuga-se com glutation hepático, dando origem a cisteína e mercaptato – os quais são eliminados pela urina

Na presença da ingestão de doses tóxicas, ocorre uma saturação na via da conjugação com sulfatados e glicuronídeos. Como resultado, há um desvio para a via antes responsável pelos 10%, que agora fica responsável por 70%. Isso implica uma maior quantidade de medicamento sendo metabolizado pelo citocromo P450 hepático, dando origem a quantidade aumentada do composto tóxico NADPQI. Como há uma quantidade limitada de glutation hepático, esse composto (NADPQI) fica livre, reagindo com celulas hepáticas, causando uma injúria hepatocelular.

  • De forma geral a dose tóxica: ADULTOS: 12g/dia -CRIANÇAS: 250mg/kg/dia

De forma geral, pois outros fatores podem influenciar na dose tóxica. Por exemplo, idade avançada, uso crônico de álcool, tabaco, uso concomitante de outras medicações hepatotóxicas (carbamazepina, fenobarbital, rifampicina, isoniazida) são fatores que potencializam os efeitos danosos. Importante ressaltar, no entanto, que a intoxicação aguda por álcool não piora a intoxicação por paracetamol.

O que fazer em um primeiro momento diante de uma intoxicação por Paracetamol?

Todos os pacientes com intoxicação por paracetamol devem receber um suporte clínico adequado, o que inclui uma monitorização contínua dos dados vitais, controle hidroeletrolítico adequado, hidratação endovenosa, controle de vias aéreas e medidas de ressuscitação cardiopulmonar.

intoxicação por paracetamol

Para os pacientes que ingeriram doses tóxicas em até 4 horas, devemos utilizar o Carvão Ativado, objetivando que ele se ligue ao paracetamol, diminuindo assim sua absorção gastrointestinal. Após 4 horas, a efetividade do procedimento cai drasticamente. Importante ressaltar que em pacientes que estão com nível de consciência rebaixado ou sedados, esse procedimento só poderá ser feito caso o paciente esteja entubado – no entanto, a entubação não é indicação para o uso de carvão ativado. E como se prescreve?

  • Carvão Ativado (activated charcoal): 1g/kg (máximo de 50g) diluído em água ou soro fisiológico 0,9% – na proporção 8ml/grama. Administrar via oral ou via sonda nasogástrica. O procedimento pode ser repetido em 2 horas para melhores resultados

*O uso de lavagem gástrica e vômitos induzidos (com xarope de ipeca por exemplo) – limitam a absorção de paracetamol; no entanto, são menos efetivos que o uso de carvão ativado, não sendo rotineiramente recomendados.

Qual antídoto do Paracetamol?

O antídoto utilizado na intoxicação por paracetamol é a N-Acetilcisteína, e seu mecanismo de ação é se ligar à metabólitos tóxicos e estimula a síntese de glutation hepático, permitindo que o NADPQI (extremamente tóxico) seja eliminado. Tem os melhores resultados se iniciados até 10 horas da intoxicação. E quando devemos usar?

  • Valores de paracetamol (medido no sangue) igual ou maior a:
    • 150 mg/L – em 4 horas
    • 70 mg/L – em 8 horas
    • 35 mg/L – em 12 horas
    • 4mg/L – em 24 horas
  • Ingestão total superior à 7,5g, independente do peso
  • Ingestão com tempo desconhecido, com níveis de paracetol sanguíneo acima de 10mg/L
  • Ingestão de qualquer dose com evidência de lesão hepática
  • Pacientes com clínica tardia (>24 horas) – com exames compatíveis com lesão hepática

Importante ressaltar que o início do antídoto não pode ser retardado por atraso de exames séricos de paracetamol, dessa forma, inicia-se empiricamente nos casos mais graves de intoxicação por paracetamol.

N-Acetilcisteína pode ser ministrada via oral ou via endovenosa. Teoricamente, a administração via oral tem a vantagem de permitir que o antídoto chega à circulação portal mais rapidamente. No entanto, estudos não confirmaram tal hipótese. A forma endovenosa deve ser usada sempre que há vômitos, falência hepática, impossibilidade de ingestão ou recusa. De toda forma, são usados rotineiramente os seguintes protocolos para administração:

  • PROTOCOLO ORAL – 72 HORAS (Apresentação: xarope 40mg/ml)(Nome comercial: Fluimucil®)
    • Dose inicial de 140mg/kg via oral, seguido de
    • 70mg/kg via oral a cada 4 horas, perfazendo um total de 17 doses
  • PROTOCOLO ENDOVENOSO – 20 HORAS (Apresentação: solução injetável 100mg/ml)
    • Dose inicial de 150mg/kg endovenoso (diluir em 200ml de SF 0,9% ou SG5%) em 1 hora
    • Na sequência, administrar 12,5mg/kg/hora endovenoso (diluir em 500ml de SF 0,9% ou SG5%) em 4 horas – perfazendo 50mg/kg em 4 horas
    • Por fim, prescrever 6,25mg/kg/hora endovenoso (diluir em 1000ml de SF 0,9% ou SG5%) em 16 horas – perfazendo 100mg/kg em 16 horas

Durante o tratamento, é de fundamental importância a medição de níveis séricos de paracetamol, TGO/TGP e coagulograma – no mínimo a cada 12 horas – para verificar a resposta adequada ao tratamento

Seguimento

Durante o internamento, não há evidência que o monitoramento repetido de níveis de Paracetamol mude o prognóstico da intoxicação por paracetamol.

  • Após o quadro agudo, níveis de TGO/TGP, coagulograma, eletrólitos, gasometria arterial, ureia e creatinina devem ser monitorados até a normalização.

Após isso, pacientes que evoluem sem complicações não necessitam de um seguimento, salvo em casos de intenção suicida, em que um acompanhamento psiquiátrico se faz necessário. Para os pacientes que evoluem com complicações, o seguimento vai depender do acometimento.

Para os pacientes que evoluem com hepatotoxicidade severa decorrente da intoxicação por paracetamol, apenas 4% evoluem com insuficiência hepática aguda – necessitando, eventualmente, de transplante hepático

Observações

  • Esse artigo é destinado para médicos e estudantes de medicina e totalmente baseado no aplicativo wemeds disponível nas plataformas web, android e ios (iphone). Para se aprofundar no assunto, baixe o app e veja a revisão completa
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Referências Bibliográficas

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