Gene TBX1 e uma nova luz no desenvolvimento cognitivo e neurológico

gene

É de se imaginar que minúsculas (principalmente microscópicas) alterações não tenham tanto impacto em uma determinada função, certo? Quem dirá então de uma mudança que corresponda a fração de uma fração de uma fração de uma fração de uma outra fração.

Mas, quando o assunto é DNA, uma cópia ausente de um gene pode desencadear um efeito cascata e resultar em características permanentes no indivíduo.

É o que acontece (ou parece acontecer) com o gene Tbx1, que foi associado ao desenvolvimento cognitivo por uma equipe do Centro de Ciências da Saúde da Universidade do Texas em San Antonio. O trabalho foi publicado esse ano na revista Molecular Psychiatry, uma das “filhas” do grupo Nature.

Ao que tudo indica, o gene presente na região 22q11.2 (a fração de uma fração…), ou mais precisamente a ausência de uma das cópias do gene, impacta na mielinização da fímbria, que por sua vez impacta na velocidade cognitiva dos indivíduos. Pelo menos quando os indivíduos estudados são camundongos. Mas vamos nos aprofundar nisso.

Começando pelo fim…

Vamos começar pelo grande espectro. Os camundongos do estudo tiveram uma das cópias do gene Tbx1 deletada. Por isso, os chamaremos de knockout.

Os indivíduos knockout tiveram menor desempenho em dois testes: o labirinto aquático de Morris (do inglês, Morris water maze) e na mudança de conjunto de atenção (do inglês, attentional set shifting). O primeiro desafia a memória espacial, enquanto o segundo avalia a flexibilidade cognitiva. A partir destes testes, foi possível observar que a velocidade cognitiva dos camundongos foi negativamente impactada.

Nota: de uma perspectiva humana, sabe-se que variações nesta região cromossômica e no gene Tbx1 estão associadas à transtornos neurológicos e cognitivos, como transtorno do espectro autista, esquizofrenia e deficiência intelectual.

Passando pelo meio…

A alteração física que poderia resultar neste comprometimento intelectual nos camundongos foi observada através de ressonância magnética (RMN) do cérebro dos animais. A única alteração visível na matéria branca foi na fímbria, que serve como ponte entre várias porções do cérebro e o hipocampo. O hipocampo, por sua vez, funciona como centro de aprendizado e memória. A partir disso, algumas hipóteses foram feitas, mas um maior entusiasmo foi dado à mielina.

A principal hipótese do grupo de pesquisa foi de que a mielina, bainha que aumenta a condução dos impulsos nervosos, ou sinapses, foi a estrutura mais prejudicada pela falta de uma cópia do Tbx1.

Terminado pelo início…

Apesar de parecer que o gene Tbx1 diminui diretamente a produção de mielina, não é bem isso que acontece. A ausência de uma cópia deste gene, na verdade, diminui a formação de células chamadas de oligodendrócitos. Estas células são as “fábricas” de mielina.

Utilizando da analogia, é como se oTbx1 fosse o acionista da fábrica “Mielina”, e não o proprietário. Desta forma, uma menor quantidade de oligodendrócitos resulta em uma menor produção de mielina. Consequentemente, com menos mielina, as sinapses são mais lentas, ou seja, a comunicação entre diferentes regiões do cérebro é prejudicada.

O que camundongos dizem sobre humanos?

Obviamente, um dos limitantes do estudo são os camundongos. A identificação do impacto do Tbx1 nestes animais permitiu identificar mudanças estruturais no cérebro que estão associadas ao comportamento do indivíduo. Novamente, ênfase deve ser dada ao indivíduo, que neste caso são camundongos. Mas nem por isso estes resultados não podem ser extrapolados.

Nas próprias palavras do Dr. Hiroi (orientador da pesquisa): “Tbx1 é apenas um dos muitos genes implicados no autismo e esquizofrenia, mas essa base mecanística que encontramos, essa mielinização prejudicada, pode ser testada para generalização em outras variantes de número de cópias e variantes ultra-raras.”

Conclusão

Este estudo com indivíduos knockout permitiu demonstrar que, embora variações das cópias de genes, conhecidas como variantes do número de cópias (CNVs), sejam raras e ocorram em menos de 1% dos pacientes com disfunções psiquiátricas, elas estão forte e consistentemente associadas aos transtornos psiquiátricos. Além disso, as CNVs geram prejuízos cognitivos graves entre os portadores com diagnóstico psiquiátrico.

Os estudos em camundongos forneceram um meio complementar para abordar as limitações desses estudos em humanos, examinando sistematicamente os papéis de pequenos segmentos cromossômicos e genes individuais em comportamentos contra um fundo genético homogêneo. Estudos deste tipo demonstraram que alguns genes presentes na região 22q11.2 (a pequena fração) contribuem para selecionar alvos comportamentais.

Já este estudo em específico demonstrou a associação de um gene em particular, o Tbx1, com o comportamento individual, mostrando que este fragmento de DNA está associado com a capacidade de interação social e a comunicação do seu portador.

Embora alterações estruturais e cognitivas vistas no estudo não sejam única e exclusivamente associadas ao gene Tbx1, os “resultados abrem uma nova janela para investigar os substratos potenciais de velocidade cognitiva alterada em portadores com CNVs do gene Tbx1 ou CNVs na região 22q11.2, principalmente em casos idiopáticos de transtorno do espectro autista e esquizofrenia.”

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Referências:

Hiramoto, T., Sumiyoshi, A., Yamauchi, T. et al. Tbx1, a gene encoded in 22q11.2 copy number variant, is a link between alterations in fimbria myelination and cognitive speed in mice. 2021.

Autism-linked gene, if deleted, results in less myelin – Medical Xpress. 2021.

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