Epigenética em foco na diabetes tipo 2

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Um estudo publicado em abril desse ano na American Diabetes Association, realizado na Universidade de Lund na Suécia, estudou a diabetes tipo 2 em gêmeos idênticos, em que apenas um irmão desenvolveu a doença. Essa nova descoberta pode contribuir para o desenvolvimento de novos métodos de tratamento.

Por aqui, já comentamos da importância dos estudos de gêmeos para o entendimento de doenças complexas e o peso da genética. Mas será que só os genes importam? Qual será a contribuição dos mecanismos epigenéticos?

Os gêmeos idênticos possuem realmente o mesmo DNA?

Gêmeos podem ser de dois tipos diferentes: os monozigóticos e os dizigóticos. Os gêmeos dizigóticos são também conhecidos por fraternos ou bivitelinos, eles são resultado da fertilização de dois óvulos e dois espermatozoides. Nesses casos, eles compartilham 50% de informação genética (o mesmo que é compartilhado entre irmãos não gêmeos), e podem ou não apresentar o mesmo sexo e ter o mesmo tipo sanguíneo.

Já os gêmeos monozigóticos (conhecidos também por idênticos ou univitelinos), são aqueles originados a partir de um único zigoto, ou seja, um único óvulo fecundado por um único espermatozoide. Gêmeos idênticos vão apresentar o mesmo histórico genético, sexo e idade, e por apresentarem essas características são interessantes para pesquisadores que buscam entender os mecanismos por trás das doenças.

Como apenas um dos irmãos pode desenvolver a diabetes do tipo 2?

A resposta para isso está nas alterações epigenéticas. As alterações epigenéticas são alterações que ocorrem sem que haja modificação na sequência do DNA, mas que podem afetar a atividade dos genes. Essas alterações podem permanecer à medida que as células se dividem, sendo que em alguns casos podem ser herdadas ao longo das gerações.

Os mecanismos epigenéticos podem ser afetados por diferentes fatores ambientais, que podem impactar no epigenoma e até mesmo alterar o fenótipo do indivíduo. Entre esses fatores estão:

  • Alimentação;
  • Ausência de exercícios físicos;
  • Estresse;
  • Exposição a metais pesados, pesticidas, escapamento de diesel, fumaça do tabaco, hidrocarbonetos aromáticos, radioatividade, entre outros.

Isso mesmo: condições ambientais podem alterar o epigenoma, e essas alterações podem ser transmitidas para as próximas gerações!

 

Existe uma variedade de doenças e comportamentos que já tem relação comprovada com mecanismos epigenéticos, entre esses estão: diversos tipos de câncer, doenças que afetam a função cognitiva, doenças respiratórias, reprodutivas, autoimunes, cardiovasculares, neurocomportamentais.

Como é possível observar, o conhecimento sobre os mecanismos epigenéticos pode trazer importantes achados para que possamos encontrar formas benéficas e menos invasivas para o tratamento de muitas doenças para os quais o tratamento ou até mesmo a cura são difíceis.

Diabetes do tipo 2

O diabetes do tipo 2 ocorre quando o organismo não consegue aproveitar adequadamente a insulina produzida – não existe a absorção adequada de insulina. A causa do diabetes do tipo 2 está diretamente relacionado ao sobrepeso, sedentarismo, níveis aumentados de triglicerídeos, hipertensão e hábitos alimentares inadequados.

Uma sugestão: leia o nosso post Existe remissão ou cura do diabetes tipo 2?

 

Como mecanismos epigenéticos estão associados ao surgimento do diabetes do tipo 2

Para que a pesquisa fosse desenvolvida foram recrutados para o estudo 14 pares de gêmeos da Suécia e da Dinamarca, entre os pares de irmãos apenas um dos gêmeos idênticos desenvolveu o diabetes do tipo 2. A idade média dos participantes era de 68 anos, e os gêmeos que desenvolveram diabetes tinham um IMC mais alto em relação aos seus irmãos que não desenvolveram a doença.

Para tentar entender por que apenas um dos irmãos teria desenvolvido a doença, os pesquisadores analisaram dois mecanismos epigenéticos em biópsias de adipócitos: a metilação do DNA e microRNAs (ou miRNAs).

Não vamos entrar em detalhes quanto aos mecanismos epigenéticos e as controvérsias quanto aos miRNAs estarem nesse cenário. Deixamos esse assunto mais molecular para um outro post. O importante é destacar que os miRNAs são pequenas moléculas responsáveis por regular a produção de proteínas nas células.

Através das análises os pesquisadores evidenciaram que o gene responsável pela produção do miRNA-30 era menos ativo em gêmeos que tinham desenvolvido diabetes do tipo 2 – o que fez com que eles tivessem níveis mais baixos de miRNA-30 no tecido adiposo do que seus irmãos que não apresentavam diabetes.

Além disso, os pesquisadores avaliaram como os baixos níveis de microRNA-30 nos adipócitos afetava a capacidade das células de absorver glicose através de ensaios de cultivo celular.

Já se é conhecido que indivíduos que apresentam diabetes do tipo 2 tem dificuldade no processamento do açúcar devido ao fato das células terem se tornado menos sensíveis a insulina. A resistência celular a insulina leva ao aumento dos níveis de açúcar no sangue. O experimento revelou então, que as células com uma quantidade menor de miRNA-30 também apresentavam uma menor capacidade de absorver glicose.

Dá uma olhada na figura:

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Gêmeos com diabetes tipo 2 apresentavam redução do miR-30 e também uma redução da captação de glicose. O mesmo foi visto na população controle – sem ter parentesco.

Esse mesmo padrão foi apresentado no grupo controle, que foi composto por 28 indivíduos com diabetes tipo 2 e 28 pessoas sem a doença. Através da comparação com o grupo controle foi possível confirmar os resultados obtidos na pesquisa, mostrando que esses são relevantes não somente para gêmeos idênticos, mas podem ser extrapolados para todas as pessoas.

Conclusões

Esse estudo traz importantes informações a respeito dos mecanismos que estão atuando por trás da doença. Além disso, pode ser um passo em direção a novas opções de tratamento, visto que os tratamentos disponíveis hoje geram muitas vezes efeitos colaterais nos pacientes, ou mesmo não permitem o controle do nível de açúcar no sangue.

Já se sabe que estão em andamento alguns estudos clínicos nos quais os miRNAs estão sendo testados como um tratamento contra o câncer. Talvez o miRNA-30 possa ser utilizado como uma substância ativa em medicamentos para tratar pacientes com diabetes tipo 2.

 

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Referências

Nilsson E, Vavakova M, et al. Differential DNA Methylation and Expression of miRNAs in Adipose Tissue From Twin Pairs Discordant for Type 2 Diabetes. American Diabetes Association 2021 Oct; 70(10): 2402-2418.

Gêmeos – Embriologia. Universidade Federal de Minas Gerais.

Diabetes (diabetes mellitus): Sintomas, Causas e Tratamentos. Ministério da Saúde 2021.

What is epigenetics? – Genetics Home Reference.

 

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