SBR 2022: atualizações do XXXIX Congresso Brasileiro de Reumatologia

congresso reumatologia pessoas reuniao

O XXXIX Congresso Brasileiro de Reumatologia desse ano está acontecendo de 07 a 10 de setembro em Gramado (RS). São quatro dias de atualizações, discussões de casos e apresentação de novos trabalhos na área.

Estamos presentes no evento e selecionamos alguns dos destaques do primeiro dia de palestras.

Mutação em gene TLR é identificada como causadora de Lúpus

Em abril desse ano um grupo de pesquisadores identificou uma alteração genética causadora de Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES). Esse trabalho foi destaque no Congresso da SBR deste ano, pois embora saibamos da influência genética no LES, diversos genes podem influenciar na sua patogênese.

O estudo propõe que mutações no gene TLR, vistas em algumas famílias com LES, são suficientes para gerar o fenótipo da doença. Essas alterações genéticas são responsáveis por gerar um excesso de ativação da sinalização TLR e NF-kB, e um aumento de proteínas MyD88 (presente em todos os TLR, e necessárias para sua ativação).

Além disso, há uma sinalização aberrante às células B autorreativas. Ou seja, as células que reconhecem autoantígenos em geral morreriam em cerca de 72 horas, mas a sobrevida delas é aumentada na presença das mutações em TLR.   

Embora os dados talvez não se apliquem a todos os casos de LES, é evidente que o aumento da sinalização de TLR7 é um fator chave na doença, e o artigo abre portas para novas terapias que bloqueiam o próprio TLR7 ou MyD88.

 

Já falamos desse trabalho aqui no nosso Portal. No nosso artigo, há mais detalhes sobre a publicação, os achados, e a associação com a patogênese da doença. Se você perdeu clique aqui.

CRISPR reumatologia genetica dna

Uso da telemedicina

O uso da telemedicina é destaque na era pós pandemia de COVID-19, e diversos estudos buscam avaliar seus impactos na saúde e qualidade de vida dos pacientes.

No evento, foi apresentado um trabalho de abril desse ano com pacientes com nefrite lúpica, randomizados para acompanhamento presencial ou por videochamadas.

Como conclusão, a telemedicina apresentou ótimos resultados. O acompanhamento dos pacientes por videochamadas melhora a satisfação do paciente, e controla a doença a curto prazo de forma semelhante às consultas presenciais.

No entanto, uma questão importante foi levantada: pacientes em acompanhamento por telemedicina tiveram maior necessidade de hospitalização em comparação ao atendimento presencial. Em alguns casos, os pacientes voltavam ao atendimento em clínicas, ou precisavam de um número maior de consultas.

Os pesquisadores comentam que esse dado pode ser devido a uma falta de confiança do paciente ou do médico em avaliar com precisão a condição clínica durante uma teleconsulta. Nesse sentido, a atividade da doença reumática pode ser mais bem avaliada de forma presencial – ou mesmo híbrida.

Aqui no portal, falamos de um trabalho que avaliou esse mesmo contexto, mas para pacientes idosos (se você perdeu, veja aqui). Embora a telemedicina tenha resultado em níveis mais baixos de atendimento ambulatorial, quando estes são necessários, os gastos hospitalares e com internamento são maiores para aqueles que são majoritariamente atendidos em casa.

telemedicina reumatologia

Uso de Anifrolumabe em pacientes com Nefrite Lupica

O uso do anifrolumabe foi associado a melhoras no tratamento destes pacientes em um novo estudo de fase II, publicado em fevereiro desse ano.

O Anifrolumabe é um anticorpo monoclonal administrado por infusão intravenosa (IV) que atua inibindo uma proteína-chave do sistema imunológico chamada de receptor IFNAR.

O receptor IFNAR atua como um transmissor, amplificando sinais de pequenos mensageiros chamados interferons do tipo I. Esse processo ativa diversas partes do sistema imunológico e pode desencadear uma grande inflamação.

 

Síndrome de Sjögren e Linfoma não Hodgkin: uma relação de risco bidirecional

Sabemos que a relação entre as doenças autoimunes e o câncer é complexa, visto a desregulação dos processos imunológicos em ambas as doenças. Um risco maior de linfoma não Hodgkin foi relatado em muitas doenças autoimunes, como é o caso da Síndrome de Sjögren primária.

Mas será que essa relação é unidirecional?

Um grupo de pesquisadores de Taiwan apresentou dados de um estudo de coorte que indica que a relação entre as doenças é bidirecional. Ou seja, pacientes com Síndrome de Sjögren primária apresentaram maior risco Linfoma não Hodgkin, e pacientes com Linfoma não Hodgkin também apresentaram maior risco de Síndrome de Sjögren.

Essa relação bidirecional foi mais proeminente dentro de um ano após o diagnóstico de cada uma das doenças.

reumatologia cancer cell immune system

Micofenolato de mofetila é aprovado para uso no Brasil

Em maio desse ano foi liberado o uso do CELLCEPT® para terapia de indução e manutenção de pacientes adultos com nefrite lúpica (classes III à V) no Brasil. O medicamento é um imunossupressor com efeito citostático nos linfócitos T e B.

A posologia recomendada é de 750 – 1500 mg duas vezes ao dia para indução, mantendo em 500 – 1000 mg duas vezes ao dia, em combinação com corticosteroides.

Terapias off-label para fibromialgia

Durante o evento, algumas condutas terapêuticas para fibromialgia foram propostas, incluindo algumas recomendações off-label:

  • Inibidores da recaptação da serotonina / noradrenalina, como duloxetina, venlafaxina, desvelafaxina, milnaciprano, demonstraram eficácia na redução da dor;
  • A amitriptlina 25 mg pode ser superior a pregabalina (150 mg) e duloxetina (30 mg) para alguns pacientes;
  • Potencial eficácia do uso de cetamina, de forma dose-dependente, na redução da dor;
  • A mirtazapina parece ter menor adesão entre os pacientes, principalmente por mais efeitos adversos relatados, como aumento de peso. Não houve um efeito potencial maior em comparação à duloxetina;
  • Outras opções off-label usadas incluem: nortriptilina, naltrexona e ciclobenzaprina;

E a vitamina D na fibromialgia?

Ainda é controverso. Os estudos de maior evidência apontam uma deficiência de vitamina D em pacientes com dor crônica, sugerindo sua suplementação. Porém, em excesso o risco de doenças cardiovasculares e renais é evidente.

Ainda são necessários estudos clínicos maiores e controlados.

vitamina D reumatologia

Mais destaques estão programados

O XXXIX Congresso Brasileiro de Reumatologia termina dia 10 de setembro, e ainda promete algumas discussões interessantes.

Durante o dia de hoje (9 de setembro), estão programadas 19 mesas redondas, 7 conferências (duas internacionais) e sessões de temas livres em lúpus, vasculites, artrite reumatoide, esclerose sistêmica, densitometria óssea, osteoporose e Sjögren e miopatias.

No sábado, além das 20 mesas redondas para discussão e revisão de casos clínicos, às 11h estão programadas duas conferências internacionais para debater sobre gestação e doenças reumáticas imunomediadas e sobre medicações que modificam o curso das espondiloartrites axiais.

Referências:

Brown, G.J., Cañete, P.F., Wang, H. et al. TLR7 gain-of-function genetic variation causes human lupus. Nature (2022). https://doi.org/10.1038/s41586-022-04642-z

So H, Chow E, Cheng IT, Lau SL, Li TK, Szeto CC, Tam LS. Use of telemedicine for follow-up of lupus nephritis in the COVID-19 outbreak: The 6-month results of a randomized controlled trial. Lupus. 2022 Apr;31(4):488-494. doi: 10.1177/09612033221084515. Epub 2022 Mar 7. PMID: 35254169; PMCID: PMC8902321.

Jayne D, Rovin B, Mysler EF, et al. Phase II randomised trial of type I interferon inhibitor anifrolumab in patients with active lupus nephritis. Annals of the Rheumatic Diseases 2022;81:496-506. https://ard.bmj.com/content/81/4/496.citation-tools

Li-Hui Wang, Wei-Ming Wang, Chun-Yu Lin, Sheng-Hsiang Lin and Chi-Chang Shieh. Bidirectional Relationship Between Primary Sjögren Syndrome and Non-Hodgkin Lymphoma: A Nationwide Taiwanese Population-based Study. The Journal of Rheumatology September 2020, 47 (9) 1374-1378; DOI: https://doi.org/10.3899/jrheum.191027.

Robinson C, Dalal S, Chitneni A, Patil A, Berger AA, Mahmood S, Orhurhu V, Kaye AD, Hasoon J. A Look at Commonly Utilized Serotonin Noradrenaline Reuptake Inhibitors (SNRIs) in Chronic Pain. Health Psychol Res. 2022 May 30;10(3):32309. doi: 10.52965/001c.32309. PMID: 35774919; PMCID: PMC9239373.

Alberti FF, Becker MW, Blatt CR, Ziegelmann PK, da Silva Dal Pizzol T, Pilger D. Comparative efficacy of amitriptyline, duloxetine and pregabalin for treating fibromyalgia in adults: an overview with network meta-analysis. Clin Rheumatol. 2022 Jul;41(7):1965-1978. doi: 10.1007/s10067-022-06129-8. Epub 2022 Mar 26. PMID: 35347488.

Pastrak M, Abd-Elsayed A, Ma F, Vrooman B, Visnjevac O. Systematic Review of the Use of Intravenous Ketamine for Fibromyalgia. Ochsner J. 2021 Winter;21(4):387-394. doi: 10.31486/toj.21.0038. PMID: 34984054; PMCID: PMC8675611.

Mehta P, Basu A, Ahmed S. Effectiveness and adverse effects of the use of mirtazapine as compared to duloxetine for fibromyalgia: real-life data from a retrospective cohort. Rheumatol Int. 2022 Sep;42(9):1549-1554. doi: 10.1007/s00296-022-05135-y. Epub 2022 Apr 27. PMID: 35475940.

Lombardo M, Feraco A, Ottaviani M, Rizzo G, Camajani E, Caprio M, Armani A. The Efficacy of Vitamin D Supplementation in the Treatment of Fibromyalgia Syndrome and Chronic Musculoskeletal Pain. Nutrients. 2022 Jul 22;14(15):3010. doi: 10.3390/nu14153010. PMID: 35893864; PMCID: PMC9330000.

Ali OME. Prevalence of Vitamin D Deficiency and Its Relationship with Clinical Outcomes in Patients with Fibromyalgia: a Systematic Review of the Literature. SN Compr Clin Med. 2022;4(1):38. doi: 10.1007/s42399-021-01105-w. Epub 2022 Jan 15. PMID: 35071984; PMCID: PMC8760589.

 

Google search engine

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui