Cardiomiopatia Chagásica: um problema de saúde pública

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A cardiomiopatia chagásica é um quadro resultante de um longo período do contato de um paciente com a infecção por T. cruzi, sofrendo os efeitos crônicos da exposição a esse parasita.

Este quadro é relevante no contexto de saúde pública uma vez que acomete elevado número de pacientes e de maneira silenciosa. Por isso, o acompanhamento correto de pacientes e o conhecimento para diagnostico apropriado e tratamento adequado aos portadores destes quadros é extremamente relevante, evitando quadros de morte súbita e possibilitando qualidade de vida e aumento na expectativa de vida destes pacientes.

Revisando a Doença de Chagas

Doença de Chagas é uma condição causada pelo protozoário flagelado Tripanosoma cruzi, e a transmissão pode ocorrer de diferentes formas. A mais comum é por insetos da família Reduviidae (barbeiro) que se alimentam exclusivamente de sangue de animais silvestres. O homem e os animais domésticos se tornaram hospedeiros do T. cruzi pelo contato com esses insetos.

A Organização mundial da saúde estima que em torno de 7 a 8 milhões de pessoas no mundo estão infectadas com o protozoário, principalmente na América Latina, e que mais de 60 milhões de pessoas sob risco de contrair a doença em países endêmicos.

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Relembrando: a doença de Chagas se caracteriza por duas fases distintas, aguda e crônica.

Na fase aguda há febre, inflamação no local da infecção e nos nodos linfáticos, parasitemia elevada e hepatoesplenomegalia. No entanto, nem sempre os sintomas são perceptíveis, devido a sua fraca intensidade.

A fase crônica tem evolução lenta, com sinais surgindo somente depois de um período. Durante a fase crônica, podem ocorrer danos irreversíveis ao coração, gerando uma miocardite crônica fibrosante, de baixa intensidade e incessante, que produz dano miocárdico progressivo.

O resultado tardio da doença em fase crônica é a cardiomiopatia crônica – denominada cardiomiopatia chagasica. O acometimento na fase crônica envolve relevante morbidade e mortalidade, sendo a principal causa de cardiomiopatia não-isquêmica na América Latina.

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Cardiomiopatia Chagásica

A cardiomiopatia da doença de Chagas ainda hoje representa um relevante problema de saúde pública, e que tem grande impacto na economia latino-americana, uma vez que apresenta alta morbidade e letalidade.

A cardiomiopatia chagásica se desenvolve na fase crônica da doença. Durante essa fase, há uma queda na parasitemia e a maioria dos portadores da doença permanece na fase crônica indeterminada; ou seja, assintomáticos durante um longo período, podendo ocorrer o aparecimento de sintomas 10 a 20 anos após a infecção.

No entanto, 10-30% das pessoas infectadas evoluem para as formas crônicas sintomáticas: forma cardíaca, forma digestiva ou forma associada (cardiodigestiva), que ocorrem devido às alterações da inervação nervosa e dilatações do coração, esôfago ou cólon. Isto leva ao desenvolvimento de cardiomiopatias.

Estima-se que a morte súbita seja a principal causa de mortalidade relacionada a cardiomiopatia chagásica, correspondendo a 55 – 65% dos óbitos. A morte súbita é frequentemente desencadeada por esforços e pode ser causada tanto por taquiarritmias graves como taquicardia e fibrilação ventricular, quanto por assistolia ou bloqueio atrioventricular completo. Taquicardias ventriculares não-sustentadas e, especialmente, sustentadas, elevam a chance da ocorrência de morte súbita, sendo mais frequente em pacientes com disfunção ventricular mais avançada.

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Desafio diagnóstico

Os critérios diagnósticos para a doença de Chagas são parasitológicos e sorológicos, e dependem da fase da doença que o indivíduo se encontra.

Na fase aguda, o critério parasitológico é a detecção de parasitas na corrente sanguínea através do exame direto do sangue periférico, como o exame de sangue fresco e o exame de sangue em gota espessa. Nesta fase também há presença de anticorpos IgM anti-T.cruzi na circulação, que pode ser detectado por ELISA (Enzyme-linked-immunosorbent-assay).

Na fase crônica, os critérios parasitológicos se tornam menos relevantes devido à baixa parasitemia no indivíduo. A avaliação clínica de disfunções deve ser somada à detecção de anticorpos IgG, por meio de dois testes sorológicos de princípios distintos ou com diferentes preparações antigênicas. Existe também um método molecular de alta sensibilidade, a reação em cadeia da polimerase (PCR), que pode ser aplicado para o diagnóstico preciso da doença.

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Tratamento

O tratamento utilizado atualmente para a doença é à base de quimioterápicos, como nifurtimox e benzonidazol – que causam severos efeitos colaterais. Estes medicamentos não tratam a fase crônica da doença, porém têm eficácia terapêutica, diminuindo a quantidade de complicações futuras e aumentando a sobrevida do paciente.

Já para as manifestações clínicas de miocardite e de insuficiência cardíaca, o tratamento é semelhante ao preconizado para os casos de miocardite de outras etiologias, incluindo medidas intensivas de suporte circulatório nos casos mais graves.

O transplante cardíaco é o tratamento de escolha para pacientes terminais portadores de cardiomiopatia chagásica. Porém, é possível observar a reativação da doença em média 35% dos pacientes. Essa reativação é controlada com o tratamento convencional para doença, aumentando assim a possibilidade de sobrevida desses pacientes.

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Referências:

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