Lítio: um sólido aliado no tratamento do transtorno bipolar

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O uso do lítio como primeira linha no tratamento do transtorno bipolar é preconizado há mais de 50 anos. Embora a intoxicação seja uma preocupação, sua eficácia é inquestionável, e seu uso na rotina clínica foi um grande avanço na história da psiquiatria.

O transtorno bipolar e o sofrimento significativo dos pacientes

As variações diárias de humor até um certo ponto são normais; afinal todos se sentem felizes ou tristes. O problema é quando um estado se torna preponderante trazendo prejuízos sociais, biológicos e psicológicos. Na alternância entre quadro depressivo (tristeza) e maníaco (euforia), estabelece-se o transtorno afetivo bipolar.

O início dos sintomas é mais comum na transição entre o fim da adolescência e o começo da vida adulta, acometendo cerca de 1% da população. Assim como diversos distúrbios psiquiátricos, a etiologia precisa ainda é desconhecida, envolvendo alterações genéticas, biológicas e psicossociais.

O transtorno bipolar é uma condição de alta morbidade e mortalidade. Os sintomas causam sofrimento clinicamente significativo e prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes do paciente.

O médico deve ter consciência de estar diante de umas das causas mais comuns de suicídio; internando os pacientes, portanto, quando houver a necessidade. Entre 25 e 50% dos pacientes tentam suicídio, e 11% efetivamente cometem. O prognóstico é pior quando associado ao abuso de drogas.

O tratamento deve levar em conta uma abordagem multidisciplinar e buscar sempre o apoio familiar. A prática de psicoterapia, principalmente do tipo “Terapia Cognitiva-Comportamental”, é um dos pilares do tratamento.

Além da psicoterapia, indica-se o uso associado de fármacos “Estabilizadores de humor”, que são considerados de primeira linha. Geralmente, a utilização deles se dá de forma individual, no entanto, em casos refratários pode se fazer associação entre eles.

Dentre os principais medicamentos recomendados, está o Carbonato de Lítio (Carbolitium®).

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Surgimento do lítio como uma solução terapêutica

O primeiro uso do Lítio na psiquiatria foi em meados de 1950, quando pesquisadores observaram que a substância “acalmava” pacientes mais agitados. A partir dos anos 70, o carbonato de lítio começou a ser comercializado oficialmente nos Estados Unidos, para o tratamento da fase maníaca do transtorno bipolar.

Apesar de ser o fármaco mais estudado e mais antigo no contexto do transtorno bipolar, seu mecanismo de ação exato ainda é desconhecido.

Efeitos neuroprotetores do lítio

Dentre os mecanismos de ação propostos, acredita-se que o medicamento altere o transporte de cátions através das membranas celulares nas células nervosas e musculares.

Além disso, pela similaridade com outros elementos (como sódio, potássio), o lítio pode influenciar na recaptação de serotonina e/ou norepinefrina e permitir inibição dos sistemas do segundo mensageiro envolvendo o ciclo de fosfatidilinositol.

O grande destaque do medicamento é para seus efeitos neuroprotetores. O uso permite o aumento da depuração de glutamato, inibindo a atividade apoptótica da glicogênio sintase-cinase, aumentando os níveis de Bcl-2 e melhorando a expressão de fatores neurotrópicos.

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Mas e a intoxicação por lítio?

A toxicidade do lítio limitou seu uso na prática clínica por muito tempo. Como mencionado, cerca de 20 anos se passaram entre o primeiro uso conhecido e a aprovação do medicamento na prática. Seu uso só foi possível graças a dosagem do lítio sérico (litemia) para monitorização individualizada dos pacientes.

Sendo um cátion monovalente, na intoxicação há competição do lítio pelo sódio e potássio nos túbulos renais. Assim, em condições que há aumento de reabsorção de sódio no rim (p.ex desidratação), há diminuição da sua eliminação. Isso explica o porquê de a intoxicação crônica decorrer tipicamente da diminuição do clearance causada por desidratação, interações medicamentosas ou insuficiência renal.

Semelhante à intoxicação por outros metais, a intoxicação pelo lítio acaba levando principalmente sintomas gastrointestinais e neurotoxicidade. Porém, é importante destacar: os óbitos são raramente relatados, principalmente se o diagnóstico e o tratamento forem realizados de forma precoce.

Uma grande conquista para os pacientes

Segundo médicos e pesquisadores da época, até cerca de 1970 não havia nenhum tratamento eficaz para pacientes eufóricos ou depressivos graves. Dessa forma, os tratamentos eram experimentais, não individualizados, incluindo internações psiquiátricas, e as taxas de suicídio eram alarmantes.

Desde a sua aplicação na rotina médica, diversos estudos têm destacado sua eficácia, evidenciando uma redução do risco de tentativa de suicídio de até dez vezes em pacientes com transtorno bipolar. Uma compreensão mais aprofundada dos seus mecanismos de ação nos ajudará a estabelecer melhor a relação entre esse medicamento e o transtorno bipolar. No entanto, é inegável que seu uso trouxe grandes benefícios à psiquiatria.

Dia 8 de julho é comemorado o Dia Nacional da Ciência do Pesquisador. O desenvolvimento do uso terapêutico do lítio é mais um dos exemplos de como a ciência e a pesquisa são ótimas aliadas na melhora do desfecho clínico dos pacientes. 

Referências:

Como lítio transformou história da saúde mental. Matías Zibell. BBC News Mundo. 3 julho 2022. Disponível em https://www.bbc.com/portuguese/geral-61879203

Won E, Kim YK. An Oldie but Goodie: Lithium in the Treatment of Bipolar Disorder through Neuroprotective and Neurotrophic Mechanisms. Int J Mol Sci. 2017 Dec 11;18(12):2679. doi: 10.3390/ijms18122679. PMID: 29232923; PMCID: PMC5751281.

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1 COMENTÁRIO

  1. Eu tomo lítio há alguns anos para me tratar de Transtorno Afetivo Bipolar tipo 2 e só tenho elogios para substância. Sem o lítio eu entro num quadro de depressão profunda. Após tomar o lítio eu me estabilizei. Comecei com uma dosagem de 450 mg e hoje estou com 600 mg mais hemifumarato de quetiapina 200 mg. Minha médica esta retirando a venlafaxina aos poucos, estou saindo dos 112,5 mg e entrando nos 75 mg no início do mês de outubro.

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