Depressão e ansiedade podem ser amenizadas por estimulação elétrica da córnea?

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Pesquisadores sugerem uma nova técnica inovadora e pouco invasiva para amenizar os sintomas de depressão e ansiedade: a estimulação elétrica através da córnea.

Alterações visuais, depressão e ansiedade: qual a relação?

Estudos anteriores já mostraram que focar no hipocampo pode ser uma boa maneira de direcionar o tratamento da depressão. Já falamos sobre um trabalho que avaliou a técnica de estimulação cerebral profunda no tratamento destes pacientes. No entanto, é uma técnica invasiva, e pode resultar em diversos efeitos colaterais.

Nesse sentido, essa relação com o hipocampo já tem sido explorada, direcionando para opções menos invasivas. Esse ano, cientistas testaram uma nova técnica que prometeu reduzir sintomas depressivos, a estimulação elétrica através da córnea (TES, do inglês transcorneal electrical stimulation). Os pesquisadores observaram um aumento da expressão de genes envolvidos no desenvolvimento e crescimento de células cerebrais no hipocampo após o experimento.

O racional desse experimento também envolve outra questão importante. Pacientes com alterações visuais são mais vulneráveis ao desenvolvimento de sintomas depressivos e ansiosos.

Em um estudo com cerca de 8 mil pacientes, sintomas de depressão e ansiedade foram associados a alterações visuais, de forma bidirecional. Adultos mais velhos com deficiência visual autorreferida eram mais propensos a relatar sintomas depressivos, enquanto aqueles que apresentavam sintomas de depressão ou ansiedade eram mais propensos a relatar alterações de visão.

Uma metanálise publicada em 2017 mostrou que o aumento da prevalência combinada de depressão foi identificado em pacientes com doenças oculares em comparação com controles saudáveis. Em relação às diferentes categorias de doenças, a maior prevalência foi revelada para a doença do olho seco, seguida por pacientes com glaucoma, degeneração macular relacionada à idade e catarata.

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Estimulação elétrica através da córnea reduziu sintomas depressivos e ansiosos em modelos animais

O grupo avaliou diferentes grupos de animais (ratos): alguns com degeneração de retina, outros com indução de estresse, e controles. Cada animal passou pelo procedimento TES uma vez por semana. Os parâmetros avaliados foram comportamentais, além de níveis de corticosterona sérica e diferentes aspectos de neuroplasticidade, como neurogênese, sinapses e apoptose neuronal.

Uma observação técnica: em modelos animais, os testes comportamentais são avaliados em situações como explorar campo aberto e cilindro ou nado forçado. Animais em estado ansioso-depressivo tendem a se isolar em cantos ou permanecerem imóveis, ao invés de explorar o ambiente.

Inicialmente, os pesquisadores observaram que animais com degeneração de retina apresentavam um aumento de sinais depressivos e ansiosos. Após o procedimento TES, estes animais apresentavam redução da maioria dos sintomas comportamentais avaliados.

A proposta dos autores é de que a estimulação elétrica exerce um efeito no hipocampo e na amígdala, via cortical e subcortical, resultando na alteração de expressão gênica local. Ambas as regiões neuronais possuem papéis regulatórios no eixo HPA, normalizando a secreção de corticoides.

De fato, os animais tratados apresentaram redução de corticosterona sérica em comparação aos não tratados, sugerindo um efeito de normalização do eixo HPA. No hipocampo dos animais tratados também foram observados efeitos neurogênicos, pelo aumento de marcadores neurais progenitores, e redução de vias apoptóticas.

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O quanto desses experimentos são aplicáveis na prática clínica?

Embora óbvio, é importante lembrar: estamos falando de pesquisa básica, em modelos animais, ainda não aplicada. E as limitações precisam ser destacadas.

Nem todos os parâmetros foram significativos entre as comparações avaliadas. Além disso, apenas corticosterona sérica foi avaliada, um marcador não específico de estresse. Mais estudos são necessários para entender e confirmar os mecanismos propostos pelos autores.

De forma histológica, não foi observada uma recuperação da retina nos animais tratados. Os ratos com as alterações da retina permaneceram com esta mais fina, e com redução de fotorreceptores.  Nesse sentido, os autores sugerem que a melhora dos sintomas, observada após o uso de TES, possa ter sido por componentes não visuais.

Ainda assim, o estudo é de grande relevância. Um estudo eletrofisiológico dos animais mostrou que a via da retina ao colículo superior de todos os animais era intacta, mesmo aqueles com degeneração visual. Dessa forma, o efeito do uso de TES é válido, permitindo a transmissão sináptica local.

Os resultados observados indicam potenciais efeitos antidepressivos e ansiolíticos de uma técnica minimamente invasiva, abrindo caminhos para estudos futuros em humanos.

Referências:

Yu et al. Antidepressant-like effects of transcorneal electrical stimulation in rat models. Brain Stimulation. V.15, p.843-856. 2022.  https://doi.org/10.1016/j.brs.2022.05.018

Zheng Y, Wu X, Lin X, Lin H. The Prevalence of Depression and Depressive Symptoms among Eye Disease Patients: A Systematic Review and Meta-analysis. Sci Rep. 2017 Apr 12;7:46453. doi: 10.1038/srep46453. PMID: 28401923; PMCID: PMC5388862.

Longitudinal Associations of Self-reported Vision Impairment With Symptoms of Anxiety and Depression Among Older Adults in the United States. JAMA Ophthalmol. 2019;137(7):793-800. doi:10.1001/jamaophthalmol.2019.1085.

Researchers discover non-invasive stimulation of eye as potential treatment of depression and dementia. MedicalXPress. July 7, 2022.

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