Lidocaína endovenosa no alívio da dor em enxaqueca crônica refratária

Um estudo publicado no mês passado trouxe uma nova perspectiva para os pacientes com enxaqueca crônica: o uso de lidocaína via infusão endovenosa no alívio da dor.

Enxaqueca crônica e refratária

Para ser diagnosticado com enxaqueca crônica os pacientes devem apresentar ≥15 dias de cefaleia por mês durante ≥3 meses, nos quais ≥8 dias do mês atendem aos critérios para enxaqueca com ou sem aura ou respondem ao tratamento específico.

Em casos nos quais o paciente não responde aos tratamentos preventivos disponíveis, e apresenta pelo menos 8 dias de cefaleia debilitante por mês por pelo menos 6 meses consecutivos, trata-se de enxaqueca crônica refratária.

Em diversos estudos clínicos, os pacientes refratários são excluídos, justamente pela falta de resposta aos tratamentos. Dessa forma, há um número limitado de terapias para alívio da dor, piorando o cenário de qualidade de vida que a dor oferece a estes pacientes.

Um tratamento que tem sido sugerido para migrânea refratária é infusão contínua de lidocaína, por vários dias. O mecanismo exato desse tipo de tratamento ainda não é completamente elucidado, mas alguns especialistas sugerem que seus efeitos centrais antinociceptivos e anti-inflamatórios desempenham um papel fundamental.

lidocaina

 

Lidocaína EV em pacientes com enxaqueca crônica refratária

Um estudo recente revisou mais de 800 registros de internações hospitalares envolvendo infusões contínuas de lidocaína por vários dias para enxaqueca. O objetivo principal foi avaliar, como desfecho primário, o alívio da dor até a alta hospitalar.

Os desfechos secundários medidos na consulta pós-alta incluíram dor de cabeça e o número de dias de dor de cabeça e porcentagem de respondedores sustentados. A porcentagem de respondedores agudos, os níveis plasmáticos de lidocaína e os efeitos adversos da droga também foram determinados.

De todos os registros avaliados, cerca de 600 admissões preencheram os critérios estabelecidos pelos pesquisadores para inclusão no estudo. A infusão de lidocaína foi iniciada a 1 mg/min e titulada até um máximo de 4 mg/min com base nos níveis plasmáticos diários, resposta à dor e tolerabilidade.

Todas as classificações de dor de cabeça foram medidas em uma escala de classificação numérica de 0-10, na qual 0 = sem dor e 10 = pior dor imaginável. Um “dia de cefaleia” foi definido como um dia para o qual o paciente relatou dor moderada ou intensa por pelo menos 4 horas e o número de dias de cefaleia que ocorreram durante os 30 dias anteriores foi registrado.

Como critérios para alta hospitalar, o paciente deveria estar livre de dor (0/10) por 12-24 horas, atingir um nível de dor que o paciente declarou permitir que ele tivesse uma função melhorada ou ter resposta mínima à terapia no 5º dia de internação.

De acordo com os pesquisadores, 87,7% dos pacientes responderam bem ao tratamento com lidocaína EV, e a classificação mediana de dor reduziu de 7,0 (IC 5-8) para 1,0 (IC 0-3) ao final da hospitalização. A dor média permaneceu baixa na visita pós-alta, e 43% dos pacientes foram respondedores sustentados por um mês. Quanto aos dias de dor, os autores também notaram uma redução.

Logo, os autores concluem que o uso de lidocaína EV como parte de um tratamento para crise de enxaqueca apresentou resultados positivos no alívio da dor imediata e sustentada.

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No entanto, algumas limitações devem ser destacadas.

Durante a hospitalização, os pacientes receberam medicamentos adicionais para enxaqueca, incluindo cetorolaco, magnésio, diidroergotamina, metilprednisolona e neurolépticos. Embora tenha sido comparada a diferença entre o uso vs. não uso de cada medicamento, a influência destas outras drogas no alívio dos sintomas dolorosos por lidocaína não pode ser totalmente descartado.

Ainda, os pesquisadores comentam que não foi avaliada a diferença entre pacientes que faziam uso de tratamento profilático para dor em comparação aos que não faziam.

Além disso, estamos falando de um estudo observacional retrospectivo. Não houve intervenções, nem comparações com grupo controle ou placebo. Dessa forma, é possível observar uma associação, mas não afirmar causalidade.

De toda forma, o estudo é válido, e traz resultados importantes para um grupo de pacientes cujo tratamento é desafiador. Para muitos pacientes, o alívio da dor, ainda que temporário, pode permitir a retomada de suas atividades diárias.

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Referências:

Schwenk ES, Walter A, Torjman MC, et al. Lidocaine infusions for refractory chronic migraine: a retrospective analysis. Reg Anesth Pain Med. 2022;47:408–413.

 

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