Síndrome pós-COVID
Alguns estudos têm demonstrado que a persistência viral pode ocorrer em algum paciente após o final dos sintomas da COVID-19, e há grande foco em avaliar como esse mecanismo pode estar relacionado a casos de doença prolongada.
A síndrome pós-COVID, (ou COVID-longa, do inglês long COVID) é caracterizada por um conjunto de sintomas que podem persistir após a recuperação da infecção aguda por SARS-CoV-2. Já foram relatados casos com sintomas de fadiga, falta de ar, dor de cabeça, dor muscular e articular, alterações do olfato e do paladar, distúrbios cognitivos e psiquiátricos. Em alguns casos, esses sintomas podem ser leves e temporários, enquanto em outros, eles podem ser mais graves e duradouros.
Um estudo publicado no fim do ano passado avaliou, dentre os sinais e sintomas relacionados à síndrome pós-COVID, alterações no padrão de sono. O grupo identificou, em um estudo de coorte prospectivo, tanto insônia quanto sonolência excessiva em pacientes com sintomas prolongados da doença.
Insônia e sonolência excessiva na COVID longa
No total, 189 pacientes foram avaliados, todos com síndrome de COVID longa – a maioria dos pacientes manteve os sintomas até a média de 18 semanas após a infecção aguda. Destes, 25,3% apresentaram sintomas relacionados ao sono, a maioria relatando insônia (22,2%).
A insônia já tem sido o distúrbio de sono mais comum relatado na literatura após a infecção por SARS-CoV-2. Isolamento social, estresse, ansiedade, resposta inflamatória persistente e uso de corticosteroides podem justificar esses achados.
Porém, esse parece ter sido o primeiro estudo que relatou casos de hipersonia em pós-COVID. No grupo de distúrbios de sono, seis pacientes relataram apresentar sonolência excessiva.
Do grupo, 4 foram submetidos a testes de polissonografia, TLMS e actigrafia. Dois pacientes foram diagnosticados com hipersonia central, e um com narcolepsia. Estes pacientes também relataram fadiga, desatenção e hiposmia persistente, e foram tratados com promotores de vigília (como modafinila).
Nenhum dos pacientes apresentavam alterações do sono antes da infecção por SARS-CoV-2.
O que pode estar acontecendo?
Vários fatores são provavelmente responsáveis pela disfunção do sono relacionada a COVID-19. No artigo, os pesquisadores sugerem que um dos mecanismos para explicar essa associação possa ter relação com a anosmia.
Um dos pacientes com sonolência excessiva apresentou atrofia do bulbo olfatório na ressonância magnética, o que pode sugerir uma relação de invasão viral do nervo olfatório e disfunção hipotalâmica – resultando em distúrbios do sono.
Também não podemos deixar de mencionar os sintomas cognitivos e psiquiátricos, mais comumente relacionados aos distúrbios do sono. No estudo, a depressão foi mais comum em pacientes com distúrbios do sono, e foi observada em metade dos pacientes com sonolência excessiva – em uma relação provavelmente bidirecional.
Há outras hipóteses que os pesquisadores elencam no trabalho, como hiperativação imune e inflamatória ou mimetismo molecular entre antígenos virais e fragmentos de hipocretina.
Revisando conceitos – narcolepsia e hipersonia central
A narcolepsia e a hipersonia central são distúrbios do sono caracterizados por sonolência excessiva diurna.
O paciente com narcolepsia pode apresentar cataplexia e outros sintomas associados, como alucinações hipnagógicas e paralisia do sono. Em casos graves, afetam significativamente a capacidade do indivíduo de manter a vigilância durante o dia. É uma doença rara, afetando cerca de 1 em 2.000 indivíduos em todo o mundo.
É causada por uma diminuição da produção ou liberação da hipocretina (também conhecida como orexina), produzida no hipotálamo e importante para a regulação da vigilância e do sono. A hipocretinopenia pode ser autoimune ou por uma degeneração dos neurônios locais.
O tratamento da narcolepsia geralmente inclui medicação para ajudar a controlar a sonolência diurna (como modafinila), terapias comportamentais ou estimulantes da hipocretina, como o solriamfetol ou hipocretina sintética.
Diferente da narcolepsia, a hipersonia central não está associada a outros sintomas como cataplexia, alucinações hipnagógicas ou paralisia do sono – a sonolência excessiva diurna é o sintoma principal.
Existem várias causas potenciais para a hipersonia central, incluindo transtornos do sono primários, como apneia obstrutiva do sono ou a síndrome das pernas inquietas, ou por transtornos do sono secundários, como depressão, ansiedade ou estresse. Alguns medicamentos, incluindo sedativos e analgésicos, também podem causar hipersonia central como efeito colateral.
O tratamento da depende da causa subjacente e tratar essa condição pode resolver o problema de sonolência diurna. Além disso, algumas terapias comportamentais, como a terapia do sono, podem ser úteis para ajudar as pessoas a gerenciar sua sonolência diurna.
Tanto a narcolepsia quanto a hipersonia central são distúrbios crônicos, que podem afetar significativamente a qualidade de vida dos indivíduos afetados. Assim, é importante que os indivíduos com suspeita procurem atendimento médico e realizem exames para o diagnóstico e tratamento adequado.
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Referências:
Hipersonia persistente: mais um sintoma da covid-19 prolongada – Medscape – 6 de janeiro de 2023.
Moura, A.E.F., Oliveira, D.N., Torres, D.M. et al. Central hypersomnia and chronic insomnia: expanding the spectrum of sleep disorders in long COVID syndrome – a prospective cohort study. BMC Neurol 22, 417 (2022). https://doi.org/10.1186/s12883-022-02940-7
Bhat S, Chokroverty S. Sleep disorders and COVID-19. Sleep Med. 2022 Mar;91:253-261. doi: 10.1016/j.sleep.2021.07.021. Epub 2021 Jul 18.