Pesquisadores alertam para o uso de paracetamol (acetaminofeno) em pacientes oncológicos, com base em um estudo que mostrou um impacto na eficácia da imunoterapia com o uso combinado das drogas.
Uso de paracetamol (acetaminofeno) para dor em pacientes oncológicos
O paracetamol (ou acetaminofeno) atua inibindo a enzima COX de forma não seletiva, reduzindo a formação de precursores de prostaglandinas e tromboxanos – o que cursa com efeito anti-inflamatório. Além disso, bloqueia a geração periférica do impulso da dor – sendo um bom analgésico.
A dor é um sintoma comum em pacientes com câncer, e acredita-se que um a cada dois ou três destes pacientes terá quadros de dor moderado a grave. Ainda, à medida que a doença progride, a dor tende a piorar.
O paracetamol sozinho ou em combinação com um opioide (como codeína ou tramadol) pode ser considerado uma estratégia eficaz para controlar a dor leve a moderada em pacientes oncológicos. No entanto, um estudo recente trouxe à tona dados interessantes quanto a associação de paracetamol e imunoterapia.
Paracetamol pode reduzir a eficácia da imunoterapia
Em maio desse ano, pesquisadores avaliaram pacientes oncológicos em uso de bloqueadores de checkpoint imunológico e expostos ao paracetamol. Foram cerca de 600 pacientes analisados, participantes de três ensaios clínicos randomizados.
Se quiser saber mais sobre os ensaios clínicos, acesse os links disponíveis nas referências.
Os pesquisadores observaram que níveis detectáveis de acetaminofeno no início do tratamento foram associados a um pior desfecho clínico em pacientes com câncer tratados com inibidores de checkpoint, independente de outros fatores prognósticos (como metástases, tipo de tumor, tratamentos anteriores).
O paracetamol reduziu significativamente a eficácia do tratamento oncológico, bem como a produção de secreção de interferon-γ. Em um dos estudos clínicos, os pacientes que utilizaram paracetamol não responderam ao bloqueio de checkpoint, e apresentaram piora na sobrevida global e na sobrevida livre de progressão.
Em modelos animais, a redução da eficácia foi associada a uma maior infiltração de células T reguladoras no tumor. Em concordância, foi observado que a IL-10, um mediador crucial da imunossupressão induzida por células T, foi significativamente aumentada após o uso combinado de paracetamol e inibidores de checkpoint.
Nesse sentido, há evidências do papel do acetaminofeno como um potencial supressor da imunidade antitumoral.
Os dados desse trabalho foram apresentados no evento anual da ASCO (American Society of Clinical Oncology) desse ano, e o artigo está em fase de publicação e ajustes finais.
Recomenda-se cautela!
O estudo aponta dados relevantes quanto a combinação dos medicamentos, sendo um alerta para os profissionais da saúde que acompanham estes pacientes. No entanto, algumas limitações precisam ser destacadas.
Sabemos que o acetaminofeno tem um tempo de meia vida relativamente curto, de 2 a 3 horas, enquanto alguns medicamentos inibidores de checkpoint podem ter até 20 dias de tempo de meia vida. Nesse sentido, deve-se ponderar a dose e tempo de uso da combinação, antes de afirmarmos uma alteração de eficácia da terapia.
Ainda, a dor é um sintoma que acompanha grande parte dos pacientes oncológicos, sendo necessário avaliar o risco-benefício da utilização de outras medicações em comparação ao paracetamol nessa população.
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Referências:
Ensaios clínicos cujos pacientes foram analisados: CheckMate 025 – NCT01668784, BIP – NCT02534649 e PREMIS – NCT03984318.
Alban Bessede et al., Impact of acetaminophen on the efficacy of immunotherapy in patients with cancer. 2022 ASCO Annual Meeting. Oral Abstract Session. J Clin Oncol 40, 2022 (suppl 16; abstr 12000). DOI: 10.1200/JCO.2022.40.16_suppl.12000.
Alban Bessede et al., Impact of acetaminophen on the efficacy of immunotherapy in cancer patients. Annals of Oncology. In press, Journal Pre-proof. May 2022. https://doi.org/10.1016/j.annonc.2022.05.010
Paracetamol ligado a diminuição da resposta à imunoterapia no câncer – Medscape – 17 de junho de 2022.