A meningite (ou meningoencefalite) é uma inflamação das meninges – as membranas que revestem o encéfalo e a medula espinhal. A inflamação é geralmente secundária a infecções por vírus, bactérias, fungos, mas também pode ser causada por neoplasias (metástases), lúpus, drogas, traumas etc.
É uma doença endêmica que acomete todos os países do mundo, apresentando-se, eventualmente, em surtos epidêmicos. No Brasil, anualmente são notificados cerca de 30.000 casos, dos quais ~20.000 são confirmados.
A doença acomete diversas idades, tendo microrganismos específicos prováveis para cada faixa etária e comorbidades. Do total de casos, cerca de 50% são de etiologia viral, 40% são de etiologia bacteriana e 10% de outras etiologias.
Cerca de 75% dos casos são causados por enterovírus: Coxsackie, poliovírus, ecovírus, enterovírus humano. O restante é causado por outros vírus, como: HSV-1 e HSV-2 (Herpes Zoster vírus), VZV (Varicela Zoster vírus), EBV (Epstein-Barr).
Meningite bacteriana
Os microrganismos mais envolvidos estão relacionados com a faixa etária. Em recém-nascidos com até 3 meses de idade, por exemplo, Streptococcus agalactiae (estreptococo do grupo B) é a principal causa. Também pode ser causada por Escherichia coli ou Listeria monocytogenes.
Em pacientes a partir dos 3 meses até 18 anos de idade, a Neisseria meningitidis é a principal causa, seguida de Streptococcus pneumoniae. Ainda, a meningite nesse grupo pode ser por Haemophilus influenzae tipo B ou Escherichia coli.
Após procedimentos neurocirúrgicos, punção lombar, DVP, geralmente as bactérias envolvidas são Staphylococcus aureus, Pseudomonas aeruginosa e Staphylococcus epidermidis. Já em pacientes diabéticos, em alcoólatras, em pacientes com infecção urinária de repetição, os bacilos Gram negativos entéricos são a principal causa.
Sinais e sintomas
A incubação é de cerca de 3-4 dias. As meningites bacterianas apresentam um quadro mais grave e dramático que as virais – que apresentam uma clínica mais leve e autolimitada. De forma geral, iniciam-se de forma aguda, podendo estar presente a tríade clássica: Febre + Cefaleia + Rigidez de Nuca.
Por rigidez de nuca, entende-se como a dor e a incapacidade do paciente em abaixar a cabeça e encostar a cabeça no peito. Pontualmente, podemos dividir os sintomas em 3 categorias:
- Síndrome toxêmica: febre e alterações de estado mental.
- Síndrome de irritação meníngea: cefaleia holocraniana de alta intensidade, rigidez de nuca. A presença de irritação pode ser avaliada por sinais clínicos – Kernig, Brudzinski, Lasègue, Lewinson, Naphziger.
- Síndrome de hipertensão intracraniana: classicamente há presença de cefaleia, náuseas e vômitos “em jato”. Esse quadro está presente em doença mais avançada.
Em crianças os sintomas podem ser inespecíficos (dificuldade em mamar, choro incontrolável, rigidez de corpo), daí a hipótese de meningite dever sempre ser considerada em criança com febre sem foco definido.
E a meningococcemia?
A meningite meningocócica é um quadro dramático que pode levar a morte em poucas horas. Decorre da infecção pela bactéria Neisseria meningitidis – em quadros que não fica restrita à infecção meníngea.
Há sepse com liberação de endotoxinas bacterianas que tem ação direta em células endoteliais, aumentando a permeabilidade, levando a necrose desse endotélio com coagulação disseminada.
Clinicamente, é caracterizada (além dos achados de meningite) por manchas vermelhas ou purpúricas, fotofobia, hemorragias internas, queda da PA e/ou choque séptico. Quanto mais se afastar do quadro de meningite, pior é o prognóstico.
Como diagnosticar um paciente com meningite?
Deve-se realizar exame físico completo, com exame neurológico, e uma anamnese questionando fatores de risco relacionado com a doença (exposição).
A partir da suspeita, deve-se realizar a punção liquórica. No entanto, essa tem como contraindicação absoluta a infecção no local puncional. Quadros de rebaixamento de consciência, papiledema, decorticação/descerebração, convulsões, estupor/coma são contraindicações relativas.
Alguns trabalhos orientam realizar exames de imagem (tomografia/ressonância) previamente (nesses casos, a antibioticoterapia empírica deve ser feita antes dos exames). A punção é deve ser realizada a nível de L1-S1, preferencialmente nos espaços entre L3-S1.
E o que a análise liquórica pode indicar?
- Pressão de abertura: em indivíduos sadios, encontra-se abaixo de 18 cmH20; em infecções bacterianas usualmente estão acima desse valor.
- Coloração: em indivíduos sadios, a cor é tipicamente de “água de rocha” – límpida e incolor. Em pacientes com meningite usualmente se torna mais turva.
- Contagem de células: em indivíduos sadios, o LCR contém até 4 células/mm3, predominando linfócitos e monócitos. Em presença de meningite, o número tende a ser maior, com as células presentes dependendo da infecção subjacente.
- Análise bioquímica: avalia presença de proteínas (valor normal até 30mg/dl), cloretos, ureia, glicose etc. O valor de glicose normal no LCR é maior do que 2/3 do valor sanguíneo. Em infecções virais o valor tende a ser normal, ao passo que em bacterianas tende a ser baixa.
- Aglutinação pelo Látex: possível pesquisar antígenos bacterianos de forma rápida. Alta especificidade e baixa sensibilidade.
- Imunoeletroforese: também auxilia na pesquisa de antígenos bacterianos.
- Exames microbiológicos: gram e cultura. Além disso, pode-se usar PCR para amplificar o DNA patogênico e fazer o diagnóstico. A partir da bacterioscopia (com gram), podemos já ter ideia do microrganismo envolvido, direcionando o tratamento.
O sucesso do tratamento depende da RAPIDEZ!
Rapidez no diagnóstico, no tratamento, na notificação e busca de casos e na profilaxia de contactantes! A identificação dos sinais e sintomas, bem como o diagnóstico e o tratamento precoces são essenciais para a melhora do prognóstico e melhores desfechos.
A meningite viral geralmente tem boa evolução sem deixar sequelas. Já a bacteriana é mais grave. Pneumococos são os microrganismos que causam maior letalidade, mesmo com tratamento, enquanto meningococos causam letalidade ~10%. Meningite por Haemophilus influenzae tipo b, embora com taxa de letalidade de apenas 5%, geralmente evolui com sequelas como surdez neurossensorial.
Lembrando que todos os pacientes devem ser internados. Os mais graves em unidade de terapia intensiva (UTI), e a depender da causa será necessário isolamento do paciente.
Quer saber mais sobre esta e outras doenças? Acesse o conteúdo completo no nosso app WeMEDS®. Disponível na versão web ou para download para iOS ou Android.
—-
Referências:
Tunkel, AR. – Clinical features and diagnosis of acute bacterial meningitis in adults. In: UpToDate, Post TW (Ed), UpToDate, Waltham, MA.
Tunkel, AR. – Treatment of bacterial meningitis caused by specific pathogens in adults. In:
Kohil A, Jemmieh S, Smatti MK, Yassine HM. Viral meningitis: an overview. Arch Virol. 2021 Feb;166(2):335-345. doi: 10.1007/s00705-020-04891-1.
Poplin V, Boulware DR, Bahr NC. Methods for rapid diagnosis of meningitis etiology in adults. Biomark Med. 2020 Apr;14(6):459-479. doi: 10.2217/bmm-2019-0333.