Essa semana, médicos das Forças de Defesa de Israel relataram que os militares em Gaza estão com Shigelose. A condição é caracterizada por quadros de diarreia aguda febril, geralmente autolimitada, causada pela bactéria Shigella.
A bactéria é transmitida via fecal-oral, e pode estar presente em alimentos comuns e suprimentos de água não tratados. É altamente contagiosa, visto que poucas bactérias são necessárias para iniciar o quadro infeccioso. Em países com recursos limitados, é a segunda maior causa de diarreia.
Shigella spp
Bactérias Shigella são patógenos em forma de bastonetes, gram-negativas, anaeróbios facultativos. Fazem parte da família Enterobacteriaceae, e o gênero tem 4 espécies conhecidas: S. dysenteriae (sorogrupo A), S. flexneri (sorogrupo B), S. boydii (sorogrupo C) e S. sonnei (sorogrupo D).
A S. sonnei em geral causa sintomas mais leves, enquanto infecção por S dysenteriae tipo 1 pode resultar em síndrome hemolítico-urêmica – anemia hemolítica microangiopática, trombocitopenia e lesão renal aguda.
A transmissão geralmente ocorre via fecal-oral e em países com menos recursos, a contaminação de alimentos comuns e suprimentos de água também são importantes mecanismos de transmissão.
O inóculo infeccioso mínimo é baixo – de 10-100 bactérias já são suficientes para o início da infecção. Ao serem ingeridas, as bactérias suportam o ácido estomacal e alcançam o intestino delgado, onde se multiplicam. Assim, um grande número de patógenos chega até o cólon.
Shigelose
A gastroenterite por bactérias Shigella (shigelose) é uma infecção que acomete a porção retossigmoide do cólon. Ao invadir a mucosa, há intensa resposta inflamatória e morte das células epiteliais locais. Isso resulta em úlceras e abscessos da mucosa colônica.
A produção de toxinas bacterianas induz secreção intestinal e liberação de água. Dessa forma, o paciente apresenta diarreia, que pode ser aquosa (30-40%), sanguinolenta (35-55%) ou mucosa (70-85%), além de cólicas abdominais.
A febre é mais comum em crianças, mas até 40% dos adultos podem apresentar – em geral baixa. Em crianças, os sintomas são mais repentinos, com irritabilidade e sonolência, perda de apetite, náuseas e vômitos. Em geral, é autolimitada em até 7 dias.
Casos graves são mais comuns em crianças, caracterizados por > 20 evacuações ao dia e febre alta, resultando em desidratação grave. Pode haver prolapso retal. Bacteremia pode ocorrer em até 7% dos casos, associada a febre alta ou hipotermia, leucocitose, desidratação grave e letargia. Em menores de 2 anos, há risco de choque.
O risco de ocorrência de infecção por Shigella é maior em crianças com < 5 anos e em idosos (> 65 anos) com múltiplas comorbidades. Em países de baixa e média renda, as espécies de Shigella são a causa mais comum de disenteria, e a segunda mais comum de diarreia.
Quando e como tratar?
Na identificação de pacientes com diarreia frequente, sanguinolenta ou não, tenesmo e cólicas abdominais, podemos estar diante de um quadro de Shigelose. Em geral, é autolimitada, e não é recomendado tratar pacientes com sintomas leves.
A terapia empírica é oferecida para crianças ou adolescentes com sintomas graves, imunocomprometidos ou pacientes altamente doentes. Nesses casos, a primeira opção é ciprofloxacino – 500 mg via oral duas vezes ao dia por 3 dias.
Após a confirmação do patógeno por cultura, e na ausência de resposta a terapia empírica, o tratamento pode ser realizado com ceftriaxona via endovenosa. Em todos os casos, é obrigatório manter reposição eletrolítica.
Lembrando que é necessário conferir suscetibilidade antimicrobiana antes do tratamento – o risco de resistência é alto, e varia conforme a região geográfica. Para infecções adquiridas na Ásia ou em locais conhecidos por alta resistência antimicrobiana a ceftriaxona é preferida.
Por fim, reforçamos que na prática médica geral, deve-se evitar uso de antibióticos de forma desnecessária, assim como limitar o tempo do uso sempre que possível.
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Referências:
UpToDate®. Shigella infection: Epidemiology, microbiology, and pathogenesis.
UpToDate®. Shigella infection: Clinical manifestations and diagnosis.
BBC NEWS Brasil. A doença que está afetando soldados israelenses em Gaza. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/articles/cqq15l479x3o. Acessado em 19/12/23.
