Festas de fim de ano: há um aumento de risco de eventos cardiovasculares?

Vários estudos sugerem que a temporada de férias e festas de fim de ano podem ser críticas para ganho de peso e aumento de risco cardiovascular. Mas o quanto será que isso está embasado em dados científicos?

As condutas são controversas nesse sentido: enquanto alguns profissionais orientam atenção e restrições alimentares, outros são mais flexíveis. Afinal, será que há um “efeito de férias” mais evidente na saúde dos pacientes? Quais os impactos no longo prazo?

Há um aumento de peso em férias e feriados?

A dieta em datas próximas dos feriados de Natal e Ano Novo têm sido alvo de diversas pesquisas em saúde humana, e há boas e recentes revisões sobre o assunto.

Uma destas mostrou que há um aumento médio de 0,4-0,9 kg em adultos nesse período, e que indivíduos com obesidade que tentam perder peso acabam regredindo no processo. Mesmo os indivíduos altamente motivados para o automonitoramento acabam perdendo um pouco o foco entre os meses de novembro a janeiro.

Especificamente entre 22 e 29 de janeiro, alguns trabalhos já mostraram maior aumento de peso, de hemoglobina glicada, colesterol total, LDL, insulina e triglicerídeos, o que sugere um aumento da ingestão de alimentos altamente energéticos (sem muitas novidades por aqui).

De forma pontual, os estudos mostram que esse aumento transitório não é prejudicial para a maioria dos pacientes. Porém, em pacientes predispostos à distúrbios relacionados ao peso, ou na ausência do retorno à normalidade, alguns riscos a longo prazo podem estar associados.

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Aumento de admissões hospitalares e eventos cardiovasculares durante as festas de fim de ano

Já é bem descrito que o pico anual de incidência de infarto agudo do miocárdio (IAM) coincide com os feriados de fim de ano, sendo o dia de maior incidência a véspera de Natal. Em 24 de dezembro, há um risco 37% maior de IAM do que em outros períodos do ano.

Pacientes que tiveram IAM próximo ao feriado de Natal (em comparação a um grupo controle em um estudo) têm maior consumo de produtos açucarados, e relatam apresentar mais estresse, depressão, preocupação de modo geral.

Também já foi visto que há um aumento de 20% nas admissões hospitalares por AVC nos finais de semana, feriados e temporadas de férias, em comparação com dias úteis. Ainda, períodos de folga já foram associados ao maior risco de mortalidade intra-hospitalar em 7 ou 30 dias, seja por AVC, tromboembolismo pulmonar (18,9%) ou dissecção aórtica aguda (29%).

Nos estudos, os pesquisadores ajustam os possíveis fatores de confusão e gravidade das doenças, o que fortalece os dados. Porém, grande parte dos trabalhos disponíveis nessa área foram realizados em populações específicas, com questões genéticas e ambientais particulares, e essa limitação não pode ser desconsiderada.

Um ponto importante levantado por autores é sobre como a escassez de recursos e profissionais de saúde é muito mais acentuada nas épocas festivas. Organizar escalas de plantonistas não é algo simples nesses períodos, e esse aspecto pode influenciar na qualidade da assistência prestada e no prognóstico do paciente.

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Holiday heart syndrome

Já falamos em um post anterior sobre a “síndrome do coração de férias”, caracterizada por arritmias cardíacas, na maioria das vezes atrial e associadas a estados alcoólicos agudos. De fato, seja observada maior incidência de arritmia atrial relacionada ao álcool durante os meses de dezembro e janeiro e em finais de semana.

Porém, é importante lembrar que a história clínica é de extrema importância nestes casos. Não devemos esquecer que em muitos consumidores de etanol, fatores concomitantes podem predispor a arritmias, incluindo tabagismo, distúrbios eletrolíticos ou metabólicos, hipertensão e apneia do sono.

Considerações finais – orientar uma alimentação consciente

Não é novidade que focar extremos alimentares pode ser prejudicial para ambos os lados: orientar total restrição alimentar ou permitir abusos “apenas nos dias de festas”.

Embora os estudos apontem diversos achados relacionando aumento de incidência de problemas de saúde e férias, não podemos considerar esta relação de causa e efeito direta – diversos fatores influenciam na saúde dos pacientes durante todo o ano.

Além disso, em muitos casos o prognóstico tende a ser favorável com a interrupção dos agentes causadores, como álcool e tabagismo. Assim, cada paciente deve ser avaliado de forma individual.

Por fim, seguimos no equilíbrio e não sejamos tão rígidos nem tão flexíveis, criando oportunidades para aproveitar as festas de fim de ano com moderação e de forma consciente.

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Referências:

Díaz-Zavala RG, Castro-Cantú MF, Valencia ME, Álvarez-Hernández G, Haby MM, Esparza-Romero J. Effect of the Holiday Season on Weight Gain: A Narrative Review. J Obes. 2017;2017:2085136. doi: 10.1155/2017/2085136. Epub 2017 Jul 4.

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Hung DP, Lin SM, Liu PP, Su IM, Hsu JY, Wu TY, Lin CC, Huang HK, Loh CH. Evaluating the “holiday season effect” of hospital care on the risk of mortality from pulmonary embolism: a nationwide analysis in Taiwan. Sci Rep. 2021 Sep 29;11(1):19376. doi: 10.1038/s41598-021-98845-5.

Su IM, Huang HK, Liu PP, Hsu JY, Lin SM, Loh CH. Mortality risk from acute aortic dissection among hospital admissions during weekends and holiday season. PLoS One. 2021 Sep 1;16(9):e0255942. doi: 10.1371/journal.pone.0255942. PMID: 34469438; PMCID: PMC8409671.

Olsson A, Thorén I, Mohammad MA, Rylance R, Platonov PG, Sparv D, Erlinge D. Christmas holiday triggers of myocardial infarction. Scand Cardiovasc J. 2021 Dec;55(6):340-344. doi: 10.1080/14017431.2021.1983638. Epub 2021 Sep 29. PMID: 34585998.

 

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