Um estudo publicado no dia 06 de novembro, na revista Science Imunnology, identificou uma nova doença rara que afeta a imunidade inata. Essa doença seria causada por mutações no fator de transcrição Helios, que interage com as células T e desempenham importante papel na resposta imune.
O sistema imunológico
O sistema imune é um dos sistemas mais complexos do corpo humano. Esse sistema é composto por componentes celulares e humorais, responsável por proteger o organismo contra invasores externos, como vírus ou bactérias, e também desempenha importante papel na detecção de células aberrantes que podem se transformar em células cancerosas.
O desenvolvimento e a função das células que fazem parte da imunidade são regulados principalmente pelos fatores de transcrição (proteínas especiais que se ligam a sequencias regulatórias de genes e ativam ou de desativam a expressão gênica).
Além do controle realizado pelos fatores de transcrição, as células do sistema imune podem ser controladas por remodeladores epigenéticos que vão controlar se certas regiões do DNA são ativas ou inativas determinando se os fatores de transcrição podem se ligam às suas sequencias alvo ou não.
A família de fatores de transcrição Ikaros é composta por um grupo de proteínas que desempenham um papel central na diferenciação e regulação de células hematopoiéticas, incluindo linfócitos.
A família de fatores de transcrição é composta por cinco membros conhecidos, Ikaros, Helios, Aiolos, Eos e Pegasus. As funções de alguns desses fatores de transcrição, em particular o fator Ikaros, já foram estudadas com detalhes, sendo que já foram detectadas mutações em membros da família Ikaros associadas a canceres hematológicos e a erros inatos do sistema imune. Porém a função do fator de transcrição Helios, ainda era apenas parcialmente conhecida.
O fator de transcrição Helios: o que se sabia até o momento
Já se sabe que Helios é predominantemente expresso no desenvolvimento de timócitos, células T ativadas e em células T reguladoras. Nas células T reguladoras, Helios é conhecido por ser importante na regulação da transcrição de vários genes. Embora esse fator de transcrição já tenha sido estudado em camundongos, o seu papel na homeostase imunológica humana e no desenvolvimento das células T ainda não é totalmente compreendido.
Como a mutação no fator de transcrição Helios afeta a imunidade
A equipe de pesquisa do Professor Kaan Boztug do St. Anna Children’s Cancer Research Institute (CCRI) e do Ludwig Boltzmann Institute for Rare and Undiagnosed Diseases (LBI-RUD), em parceria com a Medical University of Vienna e o Research Center for Molecular Medicine of the Austrian Academy of Sciences (CeMM) uniram-se para investigar um paciente que apresentava problemas desconhecidos relacionados a imunidade e a hematopoese. O paciente vinha sofrendo com infecções respiratórias recorrentes e hipogamaglobulinemia desde o nascimento.
Para buscar respostas para os sintomas apresentados pelo paciente, os pesquisadores realizaram o sequenciamento do exoma completo do paciente. Através dessa análise, foi possível identificar mutações no gene IKZF2, gene que codifica Helios. Essa mutação resultou em uma síndrome de imunodeficiência, que gerou a disfunção das células T reguladoras e de um subconjunto de células T efetoras do paciente.
Os pesquisadores utilizaram outros experimentos (sequenciamento de RNA de células únicas e ensaios funcionais in vitro) para entender melhor os efeitos da mutação em nível celular. Através dos dados obtidos, os pesquisadores descobriram que Helios retêm as propriedades de ligação e dimerização do DNA, mas perde a interação com diversas proteínas, incluindo os remodeladores epigenéticos o que gera um comprometimento do controle preciso da ativação de genes.
Ok, muita coisa molecular. Afinal, o que isso tudo significa?
Os resultados encontrados sugerem que a alteração genética encontrada em Helios apresenta efeitos prejudiciais para imunidade. Foi observado que as células T CD8+ portadoras da mutação mudaram para um estado pró-inflamatório semelhante ao efetor, já as células T CD4+ do paciente mostraram ativação prejudicada. Além disso, foi observado uma perda de células B ao longo do tempo, em quanto as células B de memória periférica foram reduzidas, as células B de transição aumentaram.
Conclusões
A ativação adequada de células T convencionais e a presença das células B são importantes para que se tenha uma resposta imune contra infecções e contra a proliferação de células cancerosas. Os resultados apresentados no estudo não apenas caracterizam um novo erro inato da imunidade, mas também definem e expandem a compreensão do papel do fator de transcrição Helios na ativação da resposta imune e também na homeostase.
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Referências