Ambivalência do CRISPR: a promessa e os perigos de mudar o DNA

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Como vimos anteriormente, a técnica de CRISPR é capaz de modificar o DNA de animais e plantas, e até mesmo de células humanas, sendo a promessa de cura de algumas doenças genéticas. Mas, será que alterar o DNA não pode levar a outras consequências? E, se eu posso alterar as características em uma doença, eu também posso alterar um individuo saudável? Posso escolher as características em um embrião? A resposta aqui é SIM.

O CRISPR é uma técnica ambivalente, ou seja, pode trazer tanto benefícios e esperanças como riscos e perigo. Essa técnica tem sido utilizada com bastante consciência, prudência e responsabilidade no meio científico. Porém, o seu uso traz diversos questionamentos éticos e é sobre isso que vamos discutir um pouco.

Questões Éticas do CRISPR

A velocidade e a facilidade com que o CRISPR permite que os pesquisadores editem genes pressiona os bioeticistas e reguladores a resolverem rapidamente diversas preocupações sobre a tecnologia – já que esta tem um potencial para introduzir grandes mudanças científicas, sociais, econômicas, éticas, jurídicas no mundo.

“E uma grande questão é: quem arca com os riscos e benefícios de uma nova tecnologia?” diz Insoo Hyun, PhD, diretor de ética em pesquisa do Center for Bioethics da Harvard Medical School.

CRISPR é um meio para um objetivo racional: consertar, curar ou reverter mutações genéticas que causam doenças ou de outra forma prejudicam vidas. As terapias genéticas mais antigas tratavam principalmente doenças. Já o CRISPR oferece uma promessa muito mais carregada: a capacidade de banir doenças hereditárias do pool genético.

Uma pausa para uma explicação: Poll genético é todo conjunto de genes de uma população.

Mas porque a grande preocupação com mudanças no “pool genético”?

A maior preocupação, ainda exagerada, é a EUGENIA, ou seja, todo mundo com o mesmo “background” genético (o nosso código de barras), o que acabaria com a variabilidade genética, tão importante para a sobrevivência de todos os seres. Como seria possível chegar nesse ponto?

Bom, isso se dá pelo simples fato do poder de CRISPR de modificar nosso código de barras.

Modificar é sempre bom?

Lembra do segundo parágrafo desse texto? Então, vamos falar um pouco mais da alteração desse nosso código. Algumas características presentes em nossos genes conferem ossos fortes, baixo risco de Alzheimer, e resistência ao HIV. Até aqui tudo bem… Só que com o CRISPR além de proporcionar a cura das doenças, ele pode ser usado em embriões para “criar” seres humanos melhorados, como por exemplo, já resistentes ao HIV ou sem risco de desenvolver Alzheimer.

CRISPR

O que parece bom a princípio. Mas até que ponto essas melhorias em busca de viver mais são saudáveis? Esse é um primeiro questionamento, ainda que esses traços chamados multigenéticos (com uma grande quantidade de genes necessária para conferir certa característica) serem difíceis de editar, visto que não se sabe com precisão a base deles e as consequências não intencionais resultantes.

Porém, essa discussão de melhorar o ser humano pode gerar consequências até agora inexploradas. Entre outros riscos apontados, sobressai o “receio de se estar a abrir a porta a novas formas de desigualdade, discriminação e conflito sociais, bem como a uma nova era de eugenia”, como já citamos.

Toda essa discussão não vem apenas de livrar o embrião de doenças genéticas, mas também do melhoramento de outros atributos físicos e psicológicos. Sabe aquela história de poder escolher a cor dos olhos do bebê? Então, aqui chegamos ao maior questionamento ético da técnica: o poder de “aumentar as habilidades físicas da criança, melhorar sua inteligência, e selecionar fenótipos específicos que são considerados desejáveis”; o sonho de ter uma criança “perfeita” (mas o que é ser perfeito, todos iguais?).

Além disso, é importante o questionamento: curar ou melhorar a humanidade para quê? Para que toda a humanidade possa ter uma melhor qualidade de vida, ou para que alguns poucos possam ter qualidades, capacidades e possibilidades maiores que os outros para se destacar e ter vantagens sobre os outros? Em outras palavras, quais seriam os grandes interesses em torno dessa técnica?

Bom terminamos essa seção com essas indagações….

Ah! E antes de ir para a próxima seção, vamos deixar aqui como a Lei Brasileira se porta em relação a modificação de embriões:

A Lei de Biossegurança, que define princípios para a manipulação genética e para os organismos geneticamente modificados, proíbe o uso do CRISPR em células germinativas humanas, assim como em embriões humanos.

Indo um pouco além…

Apesar da técnica CRISPR ser bem difundida, ainda existe uma certa incerteza sobre seu uso em embriões humanos, não só devido a toda ética envolvida. Um dos maiores desafios desse método é alterar especificamente o gene de interesse (“gene defeituoso”).

O grande motivo é que quando tentamos alterar um único gene, pode ser que aconteça um efeito em outro gene (um gene de não interesse), e o efeito no outro gene pode inclusive levar a alterações não desejáveis.

Essas consequências são difíceis de prever. Sendo assim antes que o CRISPR esteja pronto e liberado para o uso (principalmente em embriões humanos) temos que ter a certeza de que os benefícios irão superar os riscos. Por isso, inúmeros cientistas estão trabalhando para garantir o uso adequado e de menor risco do CRISPR.

 

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Referências:

Collins, Sonya. CRISPR: Is It Possible to Remove Disease From DNA?

Marshall, Lisa. CRISPR and the End of Genetic Diseases: The promise and perils of a life-changing gene splicer.

Maria Hupffer, H. and Altmann Berwig, J. (2020) ‘A tecnologia CRISPR-CAS 9: da sua compreensão aos desafios éticos, jurídicos e de governança’, Revista Pensar, 25(3). doi: 10.5020/2317-2150.2018.9722.

Sanches, Cristina. Os desafios e as esperanças trazidos pelo sistema CRISPR.

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