Adrenoleucodistrofia ligada ao X e Adrenoleucodistrofia Neonatal: semelhanças e diferenças

Adrenoleucodistrofia ligada ao X

A Adrenoleucodistrofia ligada ao X é um distúrbio neurodegenerativo, desmielinizante e progressivo, causado por uma mutação no gene ABCD1. É a doença do filme Óleo de Lorenzo, de 1992.

Embora usualmente chamada apenas de “adrenoleucodistrofia”, oficialmente é Adrenoleucodistrofia ligada ao X para diferenciar da Adrenoleucodistrofia Neonatal. Ambas apresentam herança recessiva, mas enquanto uma é ligada ao X, outra apresenta alteração em genes autossômicos.

Veja mais sobre as semelhanças e diferenças entre as duas condições.

Adrenoleucodistrofia ligada ao X – condição genética recessiva com mutação em ABCD1

A adrenoleucodistrofia ligada ao X (X-ADL) é uma doença genética rara, causa por mutações no gene ABCD1. O filme Óleo de Lorenzo, de 1992, fala sobre essa doença.

Adrenoleucodistrofia ligada ao X

Apresenta uma herança ligada ao X recessiva – dessa forma, é necessário o acometimento dos dois cromossomos X para a manifestação da condição. Isso explica o porquê de a condição ocorrer com maior frequência em homens (apenas um X, enquanto as mulheres têm 2). Na presença de um X normal, a condição não se manifesta.

O gene ABCD1 (localizado no cromossomo X) desempenha um papel significativo no sistema de transporte de ácidos graxos de cadeia muito longa (VLCFA) para os peroxissomos, onde esses ácidos podem ser metabolizados.

Logo, mutações em ABCD1 interferem nesse processo (beta-oxidação), levando ao acúmulo anormal de VLCFAs em vários órgãos do corpo e prejudicando suas funções fisiológicas normais, como metabolismo redox, a glicólise e a respiração mitocondrial.

São conhecidas mais de 2700 mutações no gene ABCD1 envolvidas com a adrenoleucodistrofia. O tipo e a localização da mutação influenciam a gravidade e a variabilidade fenotípica da doença.

Adrenoleucodistrofia ligada ao X

Adrenoleucodistrofia neonatal – condição genética recessiva com mutação em genes autossômicos

A Adrenoleucodistrofia Neonatal também é uma doença genética, neurodegenerativa, desmielinizante. No entanto, apresenta progressão rápida, causada por mutação em genes PEX, envolvidos na formação e função dos peroxissomos, e que não estão localizados no cromossomo X.

Os genes PEX são necessários para a biogênese dos peroxissomos, que atuam em diversas funções metabólicas importantes, como a beta-oxidação de ácidos graxos de cadeia muito longa (VLCFA).

Assim, da mesma forma que na X-ADL, na presença de mutações, há um acúmulo anormal de VLCFAs em vários órgãos do corpo e prejudicando suas funções fisiológicas normais – ainda que por vias diferentes.

A condição faz parte do chamado “Espectro de Zellweger” (grupo de doenças genéticas que afetam a produção de peroxissomos) – sendo ainda mais rara, com prevalência estimada de 1 em 50.000-100.000 nascimentos.

Adrenoleucodistrofia ligada ao X

Quais as consequências do acúmulo de ácidos graxos de cadeia muito longa?

Como citamos, ainda que por vias diferentes, o resultado das mutações em ambas as condições é o acúmulo de ácidos graxos de cadeia muito longa (VLCFA). E quais as consequências disso?

Os níveis elevados de VLCFA são tóxicos para as células, afetando especialmente o sistema nervoso, o fígado (causando fibrose), os rins e o córtex adrenal.

O acúmulo de VLCFAs provoca uma desmielinização progressiva, danificando e destruindo a bainha de mielina, de forma simétrica e bilateral. Essa alteração compromete gravemente a condução dos impulsos nervosos, resultando em sintomas neurológicos debilitantes.

A degradação da mielina desencadeia uma resposta inflamatória, que agrava ainda mais os danos. Há infiltração e acúmulo linfocitário perivascular e aumento da permeabilidade da barreira hematoencefálica.

Em outros órgãos, o acúmulo de VLCFA pode atuar de forma direta ou indireta.

Atuação direta: formação de fibrose hepática; formação de cistos renais; inibição dos efeitos do ACTH sobre as células adrenocorticais, prejudicando a produção de hormônios suprarrenais, como cortisol e aldosterona, resultando em insuficiência adrenal.

Atuação indireta: ativação de resposta autoimune.

Adrenoleucodistrofia ligada ao X

Principais achados clínicos da Adrenoleucodistrofia ligada ao X

A adrenoleucodistrofia pode causar diversas manifestações, variando de acordo com a gravidade da doença, a idade de apresentação, o sexo do paciente etc. De forma geral, pode ser classificada em 3 fenótipos principais:

  1. Leucodistrofia cerebral infantil

Forma mais comum (60% dos casos). Geralmente se manifesta entre os 3-10 anos de idade, sendo muito rara em adultos, e também muito rara em meninas. Caracterizada por déficits sensoriais progressivos e sérios déficits neurológicos.

O diagnóstico de TDAH inicial é comum nestes pacientes, e cerca de 20% dos pacientes do sexo masculino apresentam convulsão.

Adrenoleucodistrofia ligada ao X

  1. Insuficiência Adrenal ou Doença de Addison

Disfunção das glândulas adrenais na adrenoleucodistrofia. Resulta da redução na produção de aldosterona e cortisol, levando a manifestações como hiponatremia, fadiga, hipotensão, desidratação, hipoglicemia e fraqueza generalizada. A hiperpigmentação da pele também pode ocorrer.

A grande maioria dos casos é observada já na idade adulta, sendo incomum em mulheres.

 

  1. Adrenomieloneuropatia ou mieloneuropatia progressiva lenta

Forma mais “branda”, com apresentação típica apenas em adultos mais velhos. Em homens, a idade de acometimento é a partir dos 20 anos, enquanto em mulheres, a partir dos 40 anos (geralmente pós-menopausa).

Importante destacar: é a manifestação primária em pacientes do sexo feminino. Ou seja, mulheres acometidas geralmente apresentam a doença mais leve, e na fase adulta tardia.

Caracterizada por uma axonopatia crônica progressiva que afeta os tratos sensoriais e motores da medula espinhal. Distúrbio da marcha é o achado mais comum. Com a progressão, pode haver paraparesia espástica progressiva, neuropatia periférica, disfunção do esfíncter do intestino e bexiga, e disfunção sexual.

Adrenoleucodistrofia ligada ao X

Principais achados clínicos da Adrenoleucodistrofia Neonatal

A adrenoleucodistrofia neonatal geralmente manifesta-se logo ao nascimento. Os achados mais comuns são:

  • Dificuldade na alimentação, convulsões, hipotonia, choro fraco.
  • Muitas vezes apresentam dismorfismo facial, como: testa alta, fontanelas grandes, suturas largas, cristas supraorbitárias hipoplásicas e ponte nasal larga.
  • Atraso grave de desenvolvimento e falha de crescimento.
  • Diferentes graus de surdez sensorioneural.
  • Perda de visão, catarata, displasia do nervo óptico.
  • Alterações no esmalte dentário.
  • Hepatomegalia em 80% dos casos.
  • Cistos renais em 70% dos casos.

Adrenoleucodistrofia neonatal

Alguns bebês apresentam sinais leves ao nascimento, com manifestações importantes mais tardias. Nesses casos, temos as apresentações infantil ou adolescente/adulta, que são mais raras, e mais semelhantes à adrenoleucodistrofia ligada ao X.

Dica: para diferenciar X-ADL e ADL-neonatal, avaliar síndrome “cérebro-hepato-renal” – ou seja, se há distúrbios hepáticos e renais. A condição neonatal apresenta hepatomegalia, cistos renais e alterações neurológicas, enquanto a ligada ao X raramente apresenta alterações hepáticas e renais.

 

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Referências:

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