Em outubro, a Sociedade de Medicina Intensiva e a Sociedade de Doenças Infecciosas da América publicaram uma atualização das diretrizes para a avaliação da febre em pacientes adultos nas unidades de terapia intensiva.
Foram determinadas 12 recomendações e 9 sugestões de melhores práticas, destinadas à equipe de cuidados para pacientes gravemente doentes em UTI. Veja mais.
Atualização das diretrizes de 2008
A febre é uma ocorrência comum em pacientes hospitalizados, sendo frequentemente um indicador de infecção. A identificação do agente infeccioso de forma precoce é fundamental, mas sabemos que causas não infecciosas devem ser avaliadas de forma igualmente importante – a fim de evitar terapias excessivas e desnecessárias, como a prescrição inadequada de antibióticos.
A diretriz atual proposta em conjunto por avaliadores da SCCM (Society of Critical Care Medicine) e da IDSA (Infectious Diseases Society of America) é uma atualização das diretrizes de 2008, que avalia febre recente em pacientes adultos em unidade de terapia intensiva (UTI), sem deficiência imunológica grave.
O comitê de avaliação deste ano incluiu 12 especialistas em diversas áreas: cuidados intensivos, doenças infecciosas, microbiologia clínica, transplante de órgãos, saúde pública, pesquisa clínica e política e administração de saúde.
Definição de febre
A temperatura corporal pode variar a depender de diversos fatores – idade, sexo, variação durante o dia. Além disso, segundo os autores que elaboraram as diretrizes atuais, parece que a temperatura normal corporal tem diminuído ao longo dos últimos anos em cerca de 0,03°C. Então, vamos relembrar o que é definido como febre:
- Para grande parte dos pacientes, a febre ocorre quando a temperatura corporal está acima de 38°C.
- Em pacientes com > 65 anos que residem em instituições de cuidado de longo prazo, a febre pode ser: (1) uma temperatura oral única superior a 37,8°C, (2) diversas medições de temperatura oral superiores a 37,2°C, (3) diversas medições de temperatura retal > 37,5°C ou (4) aumento de 1,1°C em relação ao basal.
- Em pacientes em quimioterapia com neutropenia, considera-se medicação única ≥ 38,3°C ou ≥ 38°C mantida por 1 hora.
- Em pacientes em UTI, define-se com única medida ≥ 38,3°C.
Recomendações para pacientes em UTI
Recomendação para avaliação de temperatura
- Preferir medição de temperatura em dispositivos instalados para monitoramento da temperatura central – termistores. Sugere-se o uso destes dispositivos também quando houver necessidade de medição precisa para o diagnóstico. Na ausência de tais dispositivos, sugere-se avaliação de temperatura oral ou retal em vez de outros métodos menos confiáveis.
Recomendações para uso de antipiréticos
- Em pacientes críticos, evitar o uso rotineiro de antitérmicos com objetivo específico de reduzir a temperatura.
- Para pacientes gravemente doentes, nos quais o conforto pode ser adquirido por redução de temperatura, utilizar farmacoterapia antipirética, ao invés de métodos não farmacológicos.
Recomendações para exames de imagem
- Em pacientes graves com febre e na ausência de identificação da etiologia, realizar PET/TC.
- Não há evidências fortes o suficiente que suportem a avaliação de leucócitos, na ausência de etiologia determinada.
- Em pacientes críticos e radiografia de tórax alterada, realizar ultrassonografia torácica. Sugere-se experiência suficiente para identificação com segurança de derrame pleural e patologia pulmonar.
- Em pacientes graves e sem alterações na radiografia de tórax, não há evidências fortes o suficiente que suportem o uso de ultrassom como investigação inicial.
Recomendações para exames laboratoriais
- Em pacientes graves com febre de origem incerta, utilizar métodos moleculares apenas se também for realizada hemocultura.
- Em pacientes com febre recente e suspeita de pneumonia ou novos sintomas de infecção do trato respiratório superior, realizar teste para patógenos virais com painéis.
- Na ausência de sintomas adicionais e em pacientes imunocompetentes, não há evidências suficientes que suportem exames de rotina para vírus.
- Se houver baixa / intermediária probabilidade de infecção bacteriana, e sem foco claro de infecção, sugere-se medir procalcitonina e/ou proteína C reativa + avaliação clínica.
- Se houver alta probabilidade de infecção bacteriana, mas sem foco claro de infecção, não utilizar procalcitonina nem proteína C reativa para tomada de decisão.
Leia também: Importância da Procalcitonina (PCT) na avaliação infecciosa.
Boas práticas
- Sugere-se que para pacientes com febre em UTI seja realizada radiografia de tórax.
- Em pacientes com cirurgia torácica, abdominal ou pélvica recente, e na ausência de etiologia prontamente identificada, realizar tomografia computadorizada.
- Pacientes com febre sem origem óbvia e com catéter venoso central, realizar hemoculturas.
- Em pacientes graves e sem cirurgias prévias ou sem sinais abdominais ou hepáticos, não se recomenda o uso rotineiro de ultrassom como investigação inicial.
- Em pacientes graves e cirurgia abdominal recente ou sintomas abdominais suspeitos, realizar ultrassonografia diagnóstica.
- Na realização de hemocultura, coletar sequencialmente pelo menos dois conjuntos (~60 mL de sangue) de dois locais anatômicos diferentes, sem intervalo entre as coletas.
- Na realização da hemocultura em pacientes com cateter, coletar pelo menos em dois lúmens.
- Na presença de piuria e suspeita de ITU, substituir o cateter urinário e realizar urocultura do cateter recém-coletado.
- Em pacientes graves com febre recente, realizar teste para SARS-CoV-2 por PCR.
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Referências:
O’Grady, et al. Society of Critical Care Medicine and the Infectious Diseases Society of America Guidelines for Evaluating New Fever in Adult Patients in the ICU. Critical Care Medicine 51(11):p 1570-1586, November 2023. | DOI: 10.1097/CCM.0000000000006022