Em 2016, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) elaborou a diretriz de prescrição de opioides, com o objetivo de auxiliar médicos na avaliação do risco/benefício do uso destes medicamentos em pacientes com dor crônica. Porém, novas evidências surgiram nos últimos anos, comparando tratamentos, novas estratégias de dosagem, além dos efeitos de tolerância e dependência dos medicamentos.
Dessa forma, no início desse mês o CDC atualizou a diretriz que fornece recomendações quanto à prescrição de opioides para pacientes ambulatoriais maiores de 18 anos.
As novas recomendações incluem as subdivisões de manejo de dor aguda, subaguda e crônica, e excluem o tratamento da dor relacionada à doença falciforme, câncer e cuidados paliativos. As recomendações também não se aplicam a pacientes hospitalizados, ou em ambiente de observação a partir do qual possam ser internados.
Nova diretriz – áreas e princípios orientadores
A nova diretriz possui 12 recomendações práticas. Tais recomendações são destinadas aos médicos que prescrevem opioides para o manejo da dor em pacientes ambulatoriais, com pelo menos 18 anos, com dor aguda, subaguda ou crônica.
As recomendações enfatizam princípios mais gerais, a fim de evitar confusões e permitir mais flexibilidade, direcionando uma terapia mais individualizada. Além disso, cada item possui um texto de suporte e diversos dados relacionados, para apoiar a tomada de decisão.
Aqui, trouxemos um resumo das principais atualizações.
As novas recomendações são agrupadas em quatro grandes áreas (A), e cinco princípios (P) orientadores.
A1: determinar se deve ou não iniciar o uso de opioides.
A2: selecionar quais opioides e qual dosagem adequada.
A3: selecionar a duração da prescrição e realizar acompanhamento.
A4: avaliar riscos e danos potenciais.
P1: a dor (aguda, subaguda e crônica) precisa ser avaliada e tratada adequadamente, independentemente de os opioides fazerem parte de um regime de tratamento.
P2: todas as recomendações são voluntárias, e destinam-se a apoiar, não suplantar, o cuidado individualizado e centrado na pessoa. É essencial ter flexibilidade para atender as particularidades clínicas do paciente.
P3: é fundamental uma abordagem multidisciplinar no gerenciamento da dor. É necessário atender à saúde física, saúde comportamental e prover serviços e suportes de longo prazo.
P4: atentar ao uso correto da diretriz, evitando consequências não intencionais e potencialmente prejudiciais para os pacientes.
P5: realizar comunicação e atendimento inclusivo. Garantir acesso a um regime de tratamento da dor não farmacológico e farmacológico apropriado, acessível, diversificado, coordenado e eficaz para todas as pessoas.
Dessa forma, as recomendações foram propostas.
Recomendação 1: uso em dor aguda.
Otimizar o uso de terapias conforme apropriado para a condição específica e o paciente, e considerar apenas a terapia com opioides para dor aguda se os benefícios forem maiores que os riscos para o paciente. Todos os pacientes com dor devem receber tratamento que proporcione os maiores benefícios em relação aos riscos.
Recomendação 2: uso em dor subaguda e crônica.
Nesse caso, terapias não opioides são preferidas.
Otimizar o uso de outras opções farmacológicas ou não, conforme apropriado. Considerar a terapia com opioides apenas quando os benefícios esperados forem maiores que os riscos.
Antes da prescrição, os médicos devem discutir com os pacientes os benefícios realistas e os riscos conhecidos da terapia com opioides. Ainda, trabalhar metas de tratamento e considerar como descontinuar o uso em um certo período.
Recomendação 3: uso já estabelecido.
Ao iniciar a terapia com opioides para dor (seja aguda, subaguda ou crônica), preferir os de liberação imediata em vez de liberação / ação prolongada.
Recomendação 4: uso em pacientes virgens de tratamento.
Ao iniciar o tratamento em pacientes virgens de opioides, prescrever a menor dose eficaz. Se o medicamento for continuado (em caso de dor subaguda ou crônica), avaliar cuidadosamente os benefícios e riscos.
Recomendação 5: alteração de dose.
Avaliar com cautela a alteração de dose durante o tratamento. Quando possível, otimizar outras terapias, trabalhar a colaboração do paciente para redução gradual da dose. Sempre que possível, reduzir e descontinuar de forma adequada.
Aqui, houve flexibilização: não há taxas pré-determinadas. Reduzir conforme necessidade, mas sempre otimizar a terapia. Lembrando que, exceto em casos de risco de vida, não descontinuar de forma abrupta, sempre reduzir gradativamente.
Recomendação 6: dose necessária para alívio de dor aguda.
Em caso de dor aguda, nunca prescrever uma dose maior que a necessária. Em alguns casos, a dor pode continuar por mais tempo que o esperado. Se o plano inicial não era manter o uso de opioides, ou reduzir a dose após um determinado tempo, (tentar) manter o plano.
Ciclos mais curtos de tratamento, mesmo que não tão eficazes, podem reduzir sintomas de abstinência ao final do tratamento. Reavaliar sempre que necessário e considerar outras medidas de suporte, caso o tratamento leve mais tempo do que o inicialmente planejado. Sempre avaliar as causas subjacentes à dor, e tentar resolvê-las.
Novamente, houve flexibilidade, e cada caso deve ser avaliado individualmente.
Recomendação 7: avaliação periódica
Avaliar os benefícios e os riscos dentro de 1 a 4 semanas após o início da terapia para dor subaguda ou crônica, ou sempre que houver aumento da dosagem.
Recomendação 8: avaliação de risco
Avaliar risco de danos relacionados ao uso dos medicamentos periodicamente, e sempre discutir tais riscos com os pacientes.
Os pacientes devem sempre ser incluídos nessas avaliações. Sempre questionar o uso de álcool e drogas e utilizar ferramentas de análises comportamentais. Questões pessoais, gestação, histórico de doença. Tudo deve ser incluído na análise de risco.
Nessa nova atualização, também foi inserida a recomendação de estratégia, como por exemplo a oferta do uso da naloxona.
Recomendação 9: revisar histórico de medicamentos do paciente
Revisar periodicamente o uso de substâncias controladas que o paciente pode estar usando. Quando disponíveis, utilizar sistemas integrados de prescrição e conferir as dosagens e combinações recebidas pelo paciente. Sempre determinar se as combinações podem colocar o paciente em risco.
Recomendação 10: considerar testes toxicológicos
Quando julgar necessário, em caso de uso para dor subaguda ou crônica, considerar os benefícios e riscos de testes toxicológicos. Cuidar para não utilizar tais testes de forma punitiva, mas sim com contexto clínico, buscando sempre a melhora da qualidade de vida do paciente.
Recomendação 11: cuidar com interações medicamentosas
Ao prescrever analgésicos opioides associados a outros medicamentos, sempre verificar possíveis interações medicamentosas. Em especial, atentar ao uso de benzodiazepínicos e outros depressores do SNC.
Recomendação 12: focar na medicina baseada em evidências
Sempre manter as condutas e prescrições baseadas em evidências.
Não realizar protocolos de desintoxicação, sem medicamentos associados para transtorno por uso de opioides – pode aumentar o risco de abuso e overdose.
Considerações finais
O CDC declarou que utilizou dados de metanálise para elaborar a nova diretriz. Dentre os achados, destacam que o uso de opioides está comprovadamente associado a melhora no quadro de dor – aguda, subaguda ou crônica.
Além disso, destaca que a descontinuação de opioides após longos períodos de uso contínuo ainda pode ser um desafio para médicos e pacientes. A redução gradual ou a descontinuação da terapia nesses pacientes pode estar associada a riscos clinicamente significativos, e por essa forma deve ser realizada com extrema cautela.
O CDC reforça que os direcionamentos não devem ser inflexíveis. O objetivo é melhorar a comunicação entre os médicos e os pacientes quanto aos benefícios e riscos do uso dos tratamentos para a dor, incluindo os opioides. Ainda, busca-se a melhora na qualidade de vida dos pacientes, então ajustes podem ser necessários conforme individualidades.
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Referências:
Dowell D, Ragan KR, Jones CM, Baldwin GT, Chou R. CDC Clinical Practice Guideline for Prescribing Opioids for Pain — United States, 2022. MMWR Recomm Rep 2022;71(No. RR-3):1–95. DOI: http://dx.doi.org/10.15585/mmwr.rr7103a1.
Dowell D, et al. Prescribing Opioids for Pain — The New CDC Clinical Practice Guideline. November 3, 2022. DOI: 10.1056/NEJMp2211040