Um artigo publicado esse ano trouxe novos dados em relação a suplementação de vitamina C em pacientes com sepse. O diferencial do trabalho foi avaliar o uso da suplementação em monoterapia. No entanto, o tratamento não se mostrou eficaz em melhorar o desfecho clínico dos pacientes.
Sepse: uma necessidade urgente de novos tratamentos
A sepse é uma condição clínica que traz grande risco para a vida dos pacientes. É definida como uma disfunção orgânica causada por uma resposta desregulada do hospedeiro à infecção.
A condição atinge aproximadamente 49 milhões de pessoas por ano, e leva a morte de 11 milhões desses pacientes. Quando se trata de choque séptico, um quadro caracterizado por alterações circulatórias, celulares e metabólicas profundas no paciente, a mortalidade hospitalar se aproxima a 60%.
Devido ao elevado número e gravidade dos casos de sepse, diversos grupos de pesquisa pelo mundo se dedicam a compreender a fisiopatologia e mecanismos imunológicos destes quadros.
No entanto, as opções de intervenções terapêuticas são limitadas e pouco efetivas em casos graves da doença, uma vez que a ampla possibilidade de agentes causadores dos quadros sépticos e o rápido agravamento do quadro clínico. Até o momento, apenas a administração precoce de antibióticos de amplo espectro e a ressuscitação com fluidos demonstram capacidade de redução na mortalidade, evidenciando a importância do estudo e desenvolvimento de novas estratégias terapêuticas para estes quadros.
Vitamina C como potencial tratamento para sepse: algumas barreiras ainda precisam ser superadas.
Uma das formas propostas desde 2014 para auxílio no tratamento de quadros severos de sepse é o uso de ácido ascórbico em pacientes graves. É sugerido na literatura que, pelas propriedades anti-inflamatórias e antioxidantes da vitamina C, sua administração nestes casos poderia diminuir os níveis de mortalidade desses quadros sépticos.
No ano de 2017 um estudo observacional reportou um relevante aumento na sobrevida de cerca de 30% dos pacientes com quadros sépticos tratados com uma combinação de vitamina C associada a hidrocortisona e tiamina – associação denominada terapia HAT. Desde então, diversos estudos clínicos randomizados tem sido realizados com base nesta terapia.
Alguns trabalhos já descreveram redução de mediadores pró-inflamatórios e desaceleração de danos no endotélio de pacientes com quadros sépticos severos. Porém, modestas melhorias clínicas são ocasionalmente observadas, como tempo para reversão de choque e melhora de disfunções orgânica. Além disso há diversas inconsistências com relação aos dados de dosagens utilizadas, maneiras de aplicação e real papel da vitamina C na melhora dos pacientes.
Para análise do papel do ácido ascórbico em ensaios clínicos robustos, algumas variáveis precisam ser superadas.
Primeiro, as terapias combinadas. Ensaios clínicos utilizando corticosteroides como adjuvantes em choques sépticos demonstraram benefício clínico consistente – o que pode confundir resultados positivos relacionados a terapia com a vitamina C.
Além disso, é descrito que a aplicação da vitamina C in bolus pode resultar em hipovitaminose periódica paradoxal. Sendo assim, pesquisadores na Universidade Médica de Minnesota realizaram um trabalho utilizando aplicações constantes da vitamina, o que resulta em níveis séricos mais estáveis, estabilidade essa desejada para avaliar este tratamento.
Estudo Clínico: vitamina C em monoterapia.
Esse ano, diversos estudos avaliaram o papel da vitamina C em pacientes em choque séptico. Porém, esse trabalho teve o diferencial de avaliar o tratamento em monoterapia. Esse ensaio clínico duplo cego randomizado foi identificado pelo número NCT03338569, e foi desenhado para que o paciente com quadro de choque séptico seja tratado com vitamina C ou placebo.
Foram avaliados 124 pacientes. Destes, 60 receberam tratamento com vitamina C e 64 fizeram parte do grupo placebo. O paciente tratado recebeu 1.000 mg de ácido ascórbico via endovenosa in bolus em 30 minutos seguido por infusão contínua de 250 mg/hr durante 96 horas. O grupo placebo, recebeu igual volume de solução salina via endovenosa.
O grupo teve como objetivo avaliar a redução da mortalidade em 28 dias de pacientes em quadro de choque séptico, além de objetivos secundários, avaliando índices de morte e tempo de permanência sobre terapia intensiva, tempo para clearance de lactato, necessidade de terapia renal e mudanças no quadro de gravidade ao longo de 28 dias.
Vitamina C demonstra ser uma estratégia?
Ao final do estudo foi observado menor risco de morte em 28 dias dos pacientes em choque séptico de 13,9% – menor do que a média de outros estudos, que indicam cerca uma redução de 30%.
Além disso, não houve diferença estatística com relação aos desfechos secundários avaliados: tempo de permanência dos pacientes sobre terapia intensiva, índices de avaliação de falha sequencial de órgãos e avaliação de alterações fisiológicas agudas e crônicas após 96 horas, além de tempo de clearence de lactato ou tempo de hospitalização. Ainda, foram observados 3 casos adversos com possível relação com o tratamento aplicado.
Sendo assim, este estudo evidencia que não há diferença estatisticamente significativa nos tratamentos associados a vitamina C para quadros sépticos.
O trabalho apresentado reforça a necessidade de cautela no uso de vitamina C nestes pacientes, evidenciando que os dados ainda podem ser controversos e insuficientes para que esses tratamentos sejam incluídos para a rotina clínica – ao menos em monoterapia.
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Referências:
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