Esse ano, o Ministério da Saúde confirmou 53 casos de Febre Maculosa no Brasil, com o registro de oito mortes. Os casos ocorreram em São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro.
Entenda mais sobre a doença.
Febre Maculosa é transmitida pela picada de carrapatos
A Febre Maculosa é uma doença infecciosa aguda febril, transmitida por meio da picada de carrapatos que inoculam a bactéria Rickettsia rickettsii. Os carrapatos variam de acordo com a localização geográfica. No Brasil, temos o carrapato-amarelo-do-cão (Amblyomma aureolatum) e o carrapato estrela (Amblyomma cajennense).
O termo “maculosa” deriva do latim “macula” que significa “mancha” – em decorrência do exantema que essa condição causa na pele do paciente.
No Brasil é também conhecida como “Febre Maculosa Brasileira”, e a maioria dos casos se concentra na região sudeste, embora possa ocorrer em qualquer região do país. Nos EUA é conhecida como “Rocky Mountain spotted fever” (ou febre maculosa das montanhas rochosas).
A doença é considerada uma Zoonose: termo usado para designar doenças transmitida para o homem em que o ciclo pode ter outros animais vertebrados. Foi primeiro descrita em 1906, pelo médico patologista americano Howard T. Ricketts – daí o agente etiológico da condição levar seu nome em homenagem.
Quais os sintomas?
A febre maculosa pode cursar desde quadros leves até o óbito.
Na fase inicial da doença, o paciente apresenta sintomas inespecíficos, que incluem febre, dor de cabeça intensa, mal-estar, mialgia, artralgias, náuseas. Esses sintomas podem iniciar de forma abrupta ou gradual.
Entre o terceiro e o quinto dia da doença, cerca de 90% dos pacientes começam a apresentar um rash eritematoso: pequenas machas vermelhas, de 1-6 mm de diâmetro, principalmente em punhos e tornozelos e se espalhando em direção ao tronco. Essas máculas se tornam esbranquiçadas ao serem apertadas. Com a evolução tornam-se petéquias.
Lesões nas palmas das mãos e plantas dos pés são também características da doença, mas geralmente ocorrem em estágios avançados. Em uma parcela reduzida de pacientes, a erupção cutânea pode apresentar características atípicas, limitando-se a uma região específica do corpo.
Em casos mais graves, a erupção cutânea pode se tornar confluente, com algumas áreas da pele sofrendo necrose devido aos danos causados pelos patógenos na microcirculação. Esses danos são especialmente notáveis em regiões supridas por artérias terminais, como os dedos das mãos e dos pés, nariz, orelhas e genitais.
Como é feito o diagnóstico?
Um diagnóstico da febre maculosa deve ser feito a partir dos sinais e sintomas apresentados dentro de um contexto clínico-epidemiológico.
Lembre-se: às vezes a picada não dói e o paciente pode não saber ou não lembrar que foi picado! Na consulta, conferir lesões cutâneas e associar outros sintomas para o diagnóstico.
Algumas opções de exames disponíveis são: sorologia, por reação de imunofluorescência indireta (RIFI), PCR para detecção do DNA da Rickettsia no sangue, imunoistoquímica em tecidos lesionados ou cultura de isolamento da bactéria.
Os exames complementares são úteis para avaliar complicações e exclusão de diagnósticos diferenciais. Devem ser usados direcionados para as outras hipóteses diagnósticas e prováveis complicações.
No entanto, na prática o tratamento deve ser iniciado o mais rápido possível na simples suspeita clínica-epidemiológica, não devendo esperar exames confirmatórios ou mesmo a presença da erupção cutânea! Assim, a confirmação acaba sendo retrospectiva, e mais para fins epidemiológicos.
Veja então a definição de caso de Febre Maculosa, de acordo com o Ministério da Saúde.
Definição de caso de acordo com o Ministério da Saúde
De acordo com a Secretaria de Vigilância em Saúde, do Ministério da Saúde, um caso pode ser suspeito, confirmado ou descartado de acordo com alguns critérios:
- Caso suspeito
Indivíduo que apresente febre de início súbito, cefaleia, mialgia e que tenha relatado história de picada de carrapatos e/ou contato com animais domésticos e/ou silvestres e/ou ter frequentado área sabidamente de transmissão de febre maculosa, nos últimos 15 dias.
OU
Indivíduo que apresente febre de início súbito, cefaleia e mialgia seguidas de aparecimento de exantema maculopapular, entre o 2° e o 5° dia de evolução, e/ou manifestações hemorrágicas.
- Caso confirmado.
Pode ser por critério laboratorial ou clínico-epidemiológico.
Critério Laboratorial: Indivíduo cujos sinais, sintomas e antecedentes epidemiológicos atendem à definição de caso suspeito e no qual infecção por riquétsias do grupo febre maculosa tenha sido confirmada laboratorialmente em uma das provas diagnósticas.
Critério Clínico-Epidemiológico: Todo caso suspeito, associado a antecedentes epidemiológicos, que tenha vínculo ecoepidemiológico com o local provável de infecção de casos confirmados laboratorialmente e que:
- não tenha coletado material para exames laboratoriais específicos ou
- tenha resultado não reagente na RIFI IgG com amostra única coletada antes do 7º dia de doença ou
- tenha uma amostra única coletada em qualquer dia de doença com RIFI IgG reagente (com título ≥ 128) ou indeterminado ou
- tenha apenas duas amostras, coletadas com intervalo de 14 a 21 entre primeira e segunda amostras, mas sem aumento de títulos maior ou igual a quatro vezes ou
- a investigação ambiental oportuna do local provável de infecção detecte a circulação de riquétsia patogênica em vetores.
O critério clínico-epidemiológico deverá ser empregado exclusivamente para os casos suspeitos em que pertença às regiões com transmissão conhecida da febre maculosa, respeitando a definição do vínculo ecoepidemiológico apresentada acima.
- Caso descartado
Caso suspeito com diagnóstico confirmado para outra doença ou caso suspeito sem dados suficientes para confirmar o diagnóstico de febre maculosa.
Qual o prognóstico?
A taxa de mortalidade da febre maculosa pode chegar a 75% na ausência de tratamento. Alguns fatores são associados ao aumento da gravidade da doença, como idade > 60 anos, sexo masculino e deficiência de G6PD.
O quinto dia de doença é considerado um ponto de virada crucial: pacientes que iniciam o tratamento com antibióticos antes do quinto dia têm até cinco vezes mais chances de se recuperarem completamente e sem sequelas. Daí a necessidade de um tratamento precoce mesmo sem confirmação.
Em casos graves, com comprometimento de múltiplos órgãos, principalmente do sistema nervoso, os antibióticos podem ter uma eficácia limitada. Pacientes que conseguem se curar após um quadro grave ainda podem apresentar sequelas como surdez ou paralisia em algum membro.
Felizmente, há formas mais leves da doença que podem se resolver espontaneamente em duas ou três semanas. No entanto, a maioria dos casos não segue um curso benigno, e esperar para ver a evolução pode ser fatal.
É fundamental iniciar o tratamento o mais cedo possível, sem esperar pela gravidade dos sintomas. A base do tratamento é o uso de Doxiciclina.
Após se recuperarem, a maioria dos pacientes desenvolve imunidade duradoura contra a Rickettsia rickettsii, ficando protegidos contra futuras infecções.
Orientações gerais
Lembre-se: a Febre Maculosa é uma doença de notificação obrigatória imediata!
Sempre sinalizar áreas consideradas de transmissão da febre maculosa com placas ou cartazes contendo medidas de proteção.
É imprescindível a realização de medidas de esclarecimento à população logo após a suspeita do caso, incluindo visitas domiciliares e palestras nas comunidades. Ainda, divulgar amplamente documentos com medidas de prevenção e controle da doença, fornecendo os contatos das autoridades locais responsáveis.
Orientar evitar contato com carrapatos, incluindo evitar caminhar, sentar-se ou deitar-se em áreas infestadas em atividades de lazer, além de realizar vistoria periódica no corpo em busca de carrapatos em áreas de risco, removendo-os adequadamente.
Também orientar utilização de barreiras físicas, como roupas adequadas, para prevenir o contato com carrapatos. Utilizar equipamentos de proteção individual e repelentes à base de Icaridina em atividades ocupacionais, e seguir as orientações de profissionais veterinários para aplicação de carrapaticidas em animais.
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Referências:
Brasil. Ministério da Saúde. Saúde e Vigilância Sanitária. NOTA À IMPRENSA – Sobre o surto de febre maculosa em Campinas (SP). Atualizado em 21/06/2023 10h48. https://www.gov.br/saude/pt-br/canais-de-atendimento/sala-de-imprensa/notas-a-imprensa/2023/sobre-o-surto-de-febre-maculosa-em-campinas-sp
Brasil. Ministério da Saúde. Nota Informativa CGZV/DEIDT/SVS/MS Nº 10/2021, de 15 de março de 2021, que apresenta novas recomendações sobre o critério de confirmação clínico-epidemiológico para febre maculosa.
United States Centers for Disease Control and Prevention. Rocky Mountain Spotted Fever (RMSF). https://www.cdc.gov/rmsf/healthcare-providers/treatment.html