

Os esforços para a redução da mortalidade infantil são evidentes, mas o racismo ainda é um determinante social das desigualdades em questões de saúde.
Com o objetivo de estimar tais parcialidades nas taxas de mortalidade infantil por ancestralidade, um grande estudo de coorte avaliou 19 milhões de recém-nascidos no Brasil, entre 2012 e 2018.
Os resultados?
O risco de mortalidade para crianças menores de 5 anos foi maior entre filhos de mães indígenas, pardas e negras, em comparação aos filhos de mães brancas.
O racismo começa nos cuidados com as mães
Os dados dos recém-nascidos foram extraídos do Sistema Nacional de Informações sobre nascidos vivos (SINASC) e do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), com dados de 01/01/2012 até 31/12/2018. No total, 19 515 843 nascidos vivos foram classificados por raça materna, dos quais 224 213 morreram.
Do total de recém-nascidos, cerca de 56% eram filhos de mães de origem miscigenada. De 5-6% das mães eram negras, e menos de 1% eram indígenas ou asiáticas. A segunda maior proporção de nascidos vivos foi de mães brancas – 37%.
Os primeiros achados desiguais foram entre os grupos das mães. As de origem indígena, negra ou parda tiveram filhos mais cedo, uma maior proporção de filhos, e menor grau de escolaridade de forma geral, em comparação às mulheres brancas. Ainda, grande parte das mulheres negras e indígenas eram mães solteiras (51,9% e 42,9%, respectivamente).
Quanto ao número de consultas no pré-natal, a tendência observada foi a mesma. Apenas 4,7% das mulheres brancas tiveram menos de três consultas antes do parto – em comparação, por exemplo, a 28,6% das mães indígenas.
Da mesma forma, o parto via cesariana foi mais presente em mulheres brancas (67%) em comparação a indígenas (19,9%), negras (49%), pardas (49,9%) e asiáticas (57,7%).
A desigualdade racial afeta a saúde infantil nos primeiros anos de vida
Ao comparar as taxas de mortalidade dos filhos, os pesquisadores observaram maior riscos em crianças filhos de mães negras, indígenas e pardas em comparação aos filhos de mães brancas. Isso foi visto tanto no grupo geral, quanto ao separar as crianças por idade – neonatos até 27 dias, até 1 ano, 1-4 anos e até 5 anos.
Na busca de explicações para esses achados, foram avaliadas as principais causas de morte nessas crianças. Da mesma forma, houve diferença entre os grupos avaliados para morte por diarreia, influenza e pneumonia, má nutrição, causas acidentais e outras causas de doença. A população indígena foi a mais afetada, com valores de risco ajustados de até 16,39 em alguns casos.
Veja a tabela abaixo que resume os achados do grupo:
O artigo foi publicado na revista The Lancet Global Health. Para mais informações e dados mais detalhados, clique aqui.
O racismo sistêmico, estrutural e institucionalizado precisa ser combatido
O dado mais marcante que grupo menciona é que, mesmo após todas as correções estatísticas realizadas, filhos de mães indígenas apresentavam um risco (mais de) 95% maior de morrer em comparação aos filhos de mães brancas nos primeiros 5 anos de vida.
Além disso, é evidente a desigualdade das condições vivenciadas pelas mães, como redução do nível de escolaridade, baixa frequência ou início tardio do cuidado pré-natal.
Essas condições desfavoráveis possuem impacto direto na saúde do bebê, como alteração de peso ao nascer, prematuridade, além do risco de doenças evitáveis e óbito.
Nesse sentido, é evidente o peso do racismo estrutural e institucional observado na nossa cultura, que afeta tanto a saúde das mães quanto das crianças. Esses dados reforçam a importância de avaliações e monitoramento regulares da desigualdade racial.
Você conhece o manual da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra? É uma cartilha produzida pelo Ministério da Saúde, a fim de contribuir para as políticas de integração e igualdade racial em saúde. Para acessar, clique aqui.
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Referências:
Rebouças P, Goes E, Pescarini J, Ramos D, Ichihara MY, Sena S, Veiga R, Rodrigues LC, Barreto ML, Paixão ES. Ethnoracial inequalities and child mortality in Brazil: a nationwide longitudinal study of 19 million newborn babies. Lancet Glob Health. 2022 Oct;10(10): e1453-e1462. doi: 10.1016/S2214-109X(22)00333-3.
Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa. Departamento de Apoio à Gestão Participativa e ao Controle Social. Manual de Gestão para Implementação da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra. Brasília. 2018.