Esquizofrenia: nova evidência do papel das vias serotoninérgicas

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A esquizofrenia é um transtorno psiquiátrico grave, de etiologia complexa e não totalmente elucidada. O modelo mais aceito para o desenvolvimento da doença pressupõe uma vulnerabilidade inicial do indivíduo (“diátese”), seguida de um gatilho, que pode ser genético, biológico ou psicossocial.

Em janeiro desse ano, um grupo de pesquisadores da Arizona State University descobriu uma nova peça neste enorme quebra-cabeça: a privação de sono.

Esquizofrenia

A esquizofrenia é um transtorno psiquiátrico no qual o paciente apresenta alterações de pensamento, percepção e afeto. Geralmente, há manutenção da intelectualidade e consciência, mas estes podem se perder durante o curso da doença.

A doença acomete cerca de 1% da população, sem distinção de prevalência entre homens e mulheres. Quanto mais cedo o início do desenvolvimento dos sintomas, pior o prognóstico – e nesse sentido, a desvantagem está com pacientes do sexo masculino, que (em geral) iniciam os sintomas entre 10-25 anos, comparado as mulheres que iniciam os sintomas entre 25-35 anos.

Diversas teorias são investigadas quanto a fisiopatologia da esquizofrenia, em especial quanto a ação da dopamina. Um aumento da atividade dopaminérgica no SNC, particularmente na via mesolímbica, pode estar associado à doença, e os pacientes se beneficiam com o uso de antipsicóticos.

A etiologia da doença permanece desconhecida, e fatores genéticos, biológicos e psicossociais parecem estar envolvidos. O modelo “diátese-estresse” é bem aceito, no qual o indivíduo que apresenta uma predisposição ao desenvolvimento da doença, após um gatilho, inicia a apresentação dos sintomas.

Um estudo recente buscou investigar uma das vias envolvidas no desenvolvimento da doença: a privação de sono e a alteração em receptores serotoninérgicos.

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Receptores serotoninérgicos

Estudos anteriores com drogas alucinógenas e antipsicóticas revelaram um protagonista importante no funcionamento cerebral: o receptor de serotonina 2A, ou 5-HT2AR. No córtex cerebral, onde é amplamente expresso, esse receptor desempenha um papel fundamental na percepção, cognição e psicose.

O papel dos receptores 5-HT2AR no controle da capacidade de entender e processar informações tem sido extensivamente estudado. No entanto, o processo de sinalização que regula sua expressão gênica, especialmente em pacientes com esquizofrenia, permanecia pouco compreendida – pelo menos até agora.

Um estudo recente, publicado em uma das revistas do grupo Nature (Molecular Psychiatry), identificou que a privação de sono aumenta os níveis dos receptores 5-HT2AR no córtex pré-frontal de camundongos. Esse aumento é mediado por uma proteína, EGR3.

A função da EGR3 é se ligar ao DNA, e assim ligar e desligar outros genes. Então, essa proteína estimula a transcrição do gene HTR2A (o que codifica os receptores serotoninérgicos) e, consequentemente, a tradução da proteína 5-HT2AR.

As proteínas receptoras na superfície das células cerebrais controlam a rede de comunicação interna do cérebro. A quantidade de 5-HT2AR produzida e expressa na superfície da célula determina a atividade cerebral em resposta à serotonina, além de modular as drogas que se ligam ao receptor (como antipsicóticos, LSD e psilocibina, por exemplo).

Mas o que isso nos diz sobre a esquizofrenia?

Tirando o foco da dopamina

As descobertas deste estudo melhoram a compreensão de como o ambiente altera a expressão dos receptores cerebrais que medeiam a função do córtex pré-frontal. A atividade dessa região é essencial para o raciocínio espacial e a memória de trabalho, e disfunções podem contribuir para os déficits cognitivos que caracterizam a esquizofrenia.

Por muitos anos, o foco dos estudos com esquizofrenia foi a dopamina. Porém, na busca por tratamentos para sintomas psiquiátricos graves, drogas que iniciam uma resposta fisiológica pela ligação aos receptores 5-HT2A estão experimentando um ressurgimento.

A teoria serotoninérgica prediz que os pacientes que experenciam psicose podem ter uma hiper estimulação das vias mediadas por serotonina. De fato, os receptores 5-HT2A estão envolvidos nos efeitos alucinógenos de drogas, como LSD e psilocibina, sugerindo que esses receptores podem influenciar nas alucinações e distúrbios perceptivos da esquizofrenia.

O estudo em questão identifica um possível gatilho ambiental para os sintomas paranoides: a privação de sono.  Nesse sentido, o uso de antipsicóticos atípicos pode ser benéfico aos pacientes pela modulação dos receptores 5-HT2A. Além disso, possíveis medicamentos visando a redução da proteína EGR3 podem minimizar as alucinações, mediando os receptores serotoninérgicos.

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Referências:

Zhao, X., Ozols, A.B., Meyers, K.T. et al. Acute sleep deprivation upregulates serotonin 2A receptors in the frontal cortex of mice via the immediate early gene Egr3Mol Psychiatry (2022). https://doi.org/10.1038/s41380-021-01390-w

Neuroscience News. Sleep Deprivation Increases Serotonin 2a Receptor Response in Brain. Jan 2022.

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