Sepse: proteína de Toxoplasma Gondii pode ser uma opção terapêutica

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Um estudo publicado recentemente na revista Nature identificou uma proteína chamada GRA8, a partir do T. Gondii. Essa proteína é capaz de interagir com o metabolismo do hospedeiro e combater a sepse, podendo ser uma estratégia terapêutica – chamada de “ressuscitação metabólica”.

Sepse

A sepse é definida como uma disfunção orgânica causada por uma resposta desregulada do hospedeiro à infecção. É uma condição clínica que traz grande risco para a vida de pacientes, incluindo inúmeras anormalidades imunológicas, fisiológicas e bioquímicas em resposta a uma invasão microbiana.

A sepse atinge milhões de pessoas por ano, levando a morte de 11 milhões de pacientes anualmente. Quando se trata de choque séptico, um quadro de sepse caracterizado por alterações circulatórias, celulares e metabólicas profundas no paciente, a mortalidade hospitalar se aproxima a 60%.

Devido ao grande número de casos e da gravidade da sepse, diversos grupos de pesquisa têm se dedicado a compreender a fisiopatologia e mecanismos imunológicos destes quadros. Porém, as opções de intervenções terapêuticas são muito limitadas, visto a ampla possibilidade de agentes causadores dos quadros sépticos. Atualmente, apenas a administração precoce de antibióticos de amplo espectro e a ressuscitação com fluidos demonstram capacidade de redução na mortalidade, evidenciando a importância do desenvolvimento de novas tecnologias diagnósticas e terapêuticas para estes quadros.

 

GRA8: uma proteína importante para infecção por Toxoplasma Gondii

Recentemente, foi publicado na revista Nature um estudo que propõe uma nova opção terapêutica para a sepse, baseada em antígenos de grânulos densos (GRAs) do parasita intracelular Toxoplasma Gondii. Essas proteínas são cruciais para o processo de infecção por esse parasita à célula hospedeira, sendo neste trabalho descrito o antígeno GRA8.

Os pesquisadores descobriram que GRA8 atua interagindo com proteínas do hospedeiro diretamente envolvidas na ativação das mitocôndrias. O metabolismo oxidativo mitocondrial modula as demandas energéticas celulares e seu correto funcionamento. Ao observar um aumento da expressão de proteínas do complexo da cadeia respiratória (além de outros achados moleculares), conclui-se que isso representa para as células testadas um aumento no processo de fosforilação oxidativa mitocondrial, por consequência aumento de ATP mitocondrial e possível aumento de suas atividades celulares.

Avaliando ligações de GRA8 e linhagens celulares de macrófagos, foi observado que a proteína GRA8 demonstrou forte interação com diferentes subunidades de ATP sintase (ATP5A1 e ATP5C1) e proteína SIRT-3, diretamente relacionadas ao metabolismo energético de células. O complexo formado por GRA8 ligado a SIRT-3 e ATP5A1 interferem em vias regulatórias, aumentando a expressão de proteínas centrais para a cadeia respiratória das células, representando um aumento no processo de fosforilação oxidativa que auxiliam na produção de ATP e consequente estabilização do metabolismo celular.

Muita bioquímica; e qual a parte prática disso?

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Os pesquisadores trabalharam com a teoria de que este aumento e estabilização do metabolismo de células de macrófagos in vitro poderia representar um processo de sobrevida e cura para pacientes com sepse, uma vez que células prejudicadas por estes quadros sofrem com diversos tipos de estresses metabólicos.

Para avaliar esta questão, foram feitos testes in vivo. Foram testadas duas condições de tratamento: uma condição preventiva, na qual os animais eram tratados com GRA8 antes da infecção, e uma condição protetiva, na qual o tratamento ocorria após a infecção.

Foi visto que GRA8 protegeu camundongos de sepse sistêmica. Em ambos os grupos, houve uma proteção do tipo dose dependente, e o melhor resultado observado foi de 60% de sobrevivência dos animais, tanto na condição preventiva quanto na protetiva.

Os níveis de citocinas pró inflamatórias como fator de necrose tumoral-α, interleucinas 6, IL12p40 e ILβ reduziram drasticamente, enquanto IL-10 e IL-4 não foram alteradas. Ainda, foi observada uma diminuição do número de infiltrados de células imunes e uma diminuição de dano pulmonar, hepático e esplênico, observados em histologia. Nos ensaios de cultivo celular, foi novamente detectada ligação de GRA8 a SIRT3 e ATP5A1, além de desacetilação de ATP5A1 em esplenócitos.

Uma vez que a letalidade da sepse é correlacionada à contagem de colônias bacterianas em sangue e fluídos, os pesquisadores avaliaram a capacidade de GRA8 em causar um clearance bacteriano. De fato, houve uma diminuição drástica na contagem de colônias bacterianas em líquido peritoneal e sangue (sendo testadas infecções por E. coli, S. aureus e P. aeruginosa).

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Novas formas de ver o tratamento de sepse

Este estudo propõe uma nova estratégia terapêutica para o controle de quadros de sepse baseado no que o autor principal descreve como “ressuscitação metabólica”. Nesse sentido, o aumento da atividade mitocondrial induzida por GRA8 aumenta a capacidade de macrófagos e outras células do hospedeiro de sobreviverem e combaterem quadros de sepse, representando uma nova visão para possíveis intervenções terapêuticas.

A sepse está associada à glicólise aeróbica e o excessivo consumo de ATP gera o metabolismo séptico. Sendo assim, é proposto pelos autores que inibir o processo de glicólise e reativando a capacidade de fosforilação oxidativa pode contribuir para um efeito mediado principalmente por macrófagos.

Embora seja um estudo mais molecular, com descrição de vias e moléculas em potencial, este trabalho abre caminho para uma nova visão de estratégia terapêutica, manipulando as redes metabólicas do hospedeiro para o melhor combate de sepse e outros possíveis quadros de doenças infecciosas.

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Referências:

Kim YR, Kim J-S, Yun, J-S, Kim S, Kim SY, Jang K, Yang C-S, Toxoplasma gondii GRA8 induces ATP5A1-SIRT3- mediated mitochondrial metabolic resuscitation: a potential therapy for sepsis, Nature Experimental & Molecular Medicine (2018) doi:10.1038/emm.2017.308

Dominik J, Stefan K, Axel N, Sepsis – Pathophysiology and Therapeutic Concepts, Frontiers in Medicine, 2021, v 8, doi:103389/fmed.2021.628302 ISSN.2296-858X

Rudd KE, Johnson SC, Agesa KM, Shackelford KA, Tsoi D, Kievlan DR, et al. Global, regional, and national sepsis incidence and mortality, 1990-2017: analysis for the Global Burden of Disease Study. Lancet. (2020) 395:200–11. doi: 10.1016/S0140-6736(19)32989-7

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