Dor em mulheres é frequentemente subestimada por profissionais de saúde

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Apesar do padrão ouro para avaliação de dor em contextos clínicos ser através do auto-relato do paciente, reconhecer expressões faciais também é parte integrante desta avaliação, já que as expressões de dor também são uma forma de comunicação. A interpretação do observador, portanto, é um aspecto crucial para a comunicação do nível de dor sentida por pacientes.

Diversos estudos já demonstraram que essas interpretações são afetadas, não somente pelas características das expressões de dor, mas também pelas tendências do observador, assim como as características dos pacientes sofrendo de tal dor.

Dia Internacional de Luta pela Saúde da Mulher – combate ao viés de gênero na atenção à saúde

Dia 28 de maio é o Dia Internacional de Luta pela Saúde da Mulher e nenhuma outra data pode ser mais propícia para levantarmos o ponto do quanto os estereótipos de gênero parecem influenciar a percepção de profissionais da saúde, que, como já demonstrado, tendem a subestimar a percepção de dor de pacientes mulheres.

O sexo percebido de pacientes demonstrou-se como particularmente influente tanto na avaliação de dor quanto nas decisões com relação ao tratamento das dores desses pacientes. Vários estudos demonstraram que profissionais da saúde são mais propensos a recomendar tratamentos psicológicos para mulheres do que para homens, e que tendem a prescrever analgésicos mais para homens do que para mulheres.

Pacientes mulheres também tendem a esperar mais tempo para receber analgésicos e a receber menos analgésicos opioides para tratamento de dor aguda. Em outros estudos, participantes julgaram que pacientes mulheres estavam com menos dor que pacientes homens, porém, que tendiam a mais catastrofização e exagero na percepção dolorosa que pacientes do sexo masculino.

É importante citar que alguns estudos apontam o fato de que mulheres tendem a ser mais expressivas que homens, e, portanto, que os observadores poderiam estar simplesmente “descontando” as expressões faciais de mulheres ao fazer a avaliação.

Nesse sentido, seria importante o desenvolvimento de um estudo que tivesse como objetivo isolar o viés de percepção de expressões para assegurar que os resultados obtidos até hoje realmente são fruto dos estereótipos de gênero.

Ainda assim, é importante considerarmos o papel que os vieses de gênero estão exercendo na estimação de dor por parte de profissionais da saúde, já que diversos exemplos desses estereótipos já são conhecidos, como citado por Hoffman and Tarzian: “As mulheres reclamam mais que os homens; as mulheres não costumam relatar suas dores com precisão; os homens são mais estoicos e portanto, quando se queixam de dor, “é real”; e, ainda, as mulheres são mais capazes de tolerar a dor ou têm melhores habilidades de enfrentamento do que os homens”.

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O estereótipo da mulher sensível

Robinson e colegas, em 2001, formalizaram a medição de estereótipos de gênero sobre a sensação dolorosa na medida Gender Role Expectations of Pain (GREP). O GREP questiona sobre as percepções da sensibilidade, resistência e disposição de homens e mulheres para relatar a dor.

Estudos usando o GREP relataram que mulheres são vistas como mais dispostas a relatar a dor, mais sensíveis à estímulos dolorosos e menos capazes de suportá-los do que os homens. Esses estereótipos de gênero, portanto, podem representar mecanismos subjacentes a vieses de gênero na avaliação e tratamento.

Em resumo, independentemente do aspecto do quanto as expressões faciais são mais ou menos apresentadas por cada gênero, parece realmente haver uma tendência para que observadores subestimem a dor de mulheres, enquanto superestimam a dor de homens. Esses achados apontam para a importância da atenção dos profissionais da saúde com relação a seus próprios vieses de gênero, já que estes parecem ser um obstáculo para o tratamento eficaz da dor em mulheres.

Alguns estudos, ainda, sugerem a importância da educação com relação aos estereótipos de gênero nas escolas como uma alternativa para mitigar essas influências para gerações futuras. Porém, devemos ressaltar a importância do preparo de profissionais da saúde para a tomada de consciência do impacto dos estereótipos de gênero em sua atuação profissional para que a saúde da mulher seja cada vez mais tratada de forma justa.

Referências:

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