O Dia Internacional da Higiene Menstrual é celebrado mundialmente em 28 de maio. Instituído pela ONG alemã WASH United em 2013, essa data foi escolhida simbolicamente, pois maio é o quinto mês do ano e o ciclo menstrual típico é de 28 dias.
O objetivo dessa data é quebrar o estigma a redor da menstruação, promover a educação em saúde menstrual e garantir que todas as pessoas que menstruam tenham acesso não só a produtos de higiene menstrual, mas também à educação de qualidade para que possam lidar com seus ciclos menstruais com dignidade e segurança.
Dia mundial da higiene menstrual: precisamos falar sobre saúde menstrual a partir de uma ótica mais ampla
A saúde menstrual é crucial para a saúde e o bem-estar de todas as pessoas que menstruam. A falta de acesso a produtos menstruais adequados, saneamento básico de qualidade, instalações sanitárias seguras e informação correta leva a infecções, doenças e impactos negativos na educação e na vida profissional.
A menstruação é cercada por diversos tabus e desinformação, contribuindo enormemente para a discriminação e a exclusão social, e quando ampliamos o debate para o cenário brasileiro, observamos a necessidade crescente de debater o tema com seriedade.
O relatório “A Pobreza Menstrual Vivenciada Pelas Meninas Brasileiras.” do UNICEF e UNFPA, publicado em 2021, destaca que a pobreza menstrual é um fenômeno multidimensional, refletindo as desigualdades de gênero, raça, região e classe social.
A falta de produtos menstruais adequados leva muitas meninas e mulheres a utilizarem soluções improvisadas, como pedaços de pano, roupas velhas e até miolo de pão, expondo-se a riscos de saúde significativos, incluindo infecções e a síndrome do choque tóxico. A permanência prolongada com o mesmo absorvente, devido ao custo elevado ou à falta de acesso, pode causar irritações, alergias e infecções urogenitais.
Além dos impactos físicos, a pobreza menstrual também afeta a saúde emocional e o desenvolvimento acadêmico. Meninas frequentemente faltam à escola durante o período menstrual por vergonha ou falta de condições adequadas, comprometendo seu desempenho escolar e, consequentemente, suas futuras oportunidades profissionais. O relatório aponta que 1 em cada 4 adolescentes já faltou à escola por não poder comprar produtos menstruais.
Além disso, o relatório destaca que cerca de 13,6 milhões de brasileiros vivem em condições de extrema pobreza, sobrevivendo com menos de US$ 1,90 por dia. Aproximadamente 51,5 milhões estão abaixo da linha de pobreza, e cerca de 4 milhões de meninas não têm acesso a itens básicos de cuidados menstruais nas escolas, e aproximadamente 713 mil vivem sem acesso a banheiro ou chuveiro em casa. Esses dados ressaltam a urgência de abordar a pobreza menstrual como uma questão crítica de saúde pública.
Saúde Menstrual: Um Conceito Amplo
Segundo o artigo “Menstrual health: a definition for policy, practice, and research” publicado na revista Sexual and Reproductive Health Matters, a saúde menstrual é definida como um estado de completo bem-estar físico, mental e social em relação ao ciclo menstrual, e não apenas a ausência de doenças ou enfermidades. Para alcançar a saúde menstrual, é necessário considerar vários aspectos interrelacionados, que incluem:
Acesso a Informações Precisas e Apropriadas
A educação sobre menstruação deve ser abrangente, cobrindo aspectos biológicos, psicológicos e sociais do ciclo menstrual. As informações precisam ser adaptadas à idade e ao contexto cultural, garantindo que toda a população compreenda o que é a menstruação, como lidar com ela, como o ciclo hormonal impacta o dia a dia e onde procurar ajuda em caso de problemas.
Produtos Menstruais Seguros e Eficazes
É essencial que todas as pessoas que menstruam tenham acesso a produtos menstruais seguros, eficazes e acessíveis, como absorventes, tampões e coletores menstruais. Estes produtos devem ser fornecidos em quantidades suficientes e devem ser culturalmente aceitáveis.
Instalações Sanitárias Adequadas
O acesso a instalações sanitárias seguras e privadas é crucial para que as pessoas possam gerenciar sua menstruação de forma higiênica e digna. Isso inclui acesso a banheiros limpos, água e sabão, e locais seguros para a troca e descarte dos produtos menstruais.
Diagnóstico e Tratamento de Distúrbios Menstruais
Problemas menstruais, como dores intensas, sangramento excessivo ou irregular, e condições como a endometriose e a síndrome do ovário policístico (SOP), devem ser diagnosticados e tratados adequadamente. O acesso a serviços de saúde reprodutiva e a profissionais capacitados é essencial para garantir que esses problemas sejam tratados de maneira eficaz.
Ambiente Positivo e Respeitoso
É fundamental criar um ambiente onde a menstruação possa ser discutida abertamente e sem vergonha. Isso inclui combater tabus e estigmas associados à menstruação, promovendo uma cultura de respeito e apoio.
Participação em Todas as Esferas da Vida
As pessoas que menstruam devem ter a liberdade de participar plenamente de todas as atividades sociais, educacionais e profissionais, independentemente de estarem menstruando. Isso requer políticas e práticas que garantam a inclusão e a equidade.
Avanços no Brasil
Recentemente, o Brasil deu um passo significativo para melhorar a saúde menstrual com a atualização de suas políticas públicas. Em outubro de 2021, o governo federal sancionou a Lei nº 14.214, que prevê a distribuição gratuita de absorventes higiênicos para estudantes de baixa renda de escolas públicas, mulheres em situação de rua ou vulnerabilidade social e presidiárias. A lei também determina que as cestas básicas entregues pelo Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional incluam absorventes higiênicos.
Recentemente, o governo federal regulamentou essa lei, reforçando a distribuição gratuita de absorventes em escolas públicas e outras instituições através da Campanha de Dignidade Menstrual. A campanha amplia a distribuição gratuita de absorventes para beneficiar mais de 24 milhões de pessoas em todo o país.
A partir de 17 de janeiro de 2024, a distribuição deve ser realizada através do Sistema Único de Saúde (SUS) e farmácias credenciadas pelo Programa Farmácia Popular. Além disso, a campanha foca em ações educativas e na melhoria da infraestrutura sanitária em escolas e espaços públicos, complementando as ações previstas na lei.
Implementação e Impactos Esperados
A implementação desta política requer a cooperação entre diversas esferas do governo e a sociedade civil. Escolas, unidades de saúde e centros de assistência social serão pontos chave na distribuição dos absorventes e na disseminação de informações educativas.
A expectativa é que, com a distribuição gratuita de absorventes e a realização de campanhas educativas, haja uma redução significativa na evasão escolar relacionada à menstruação, uma melhora na saúde e no bem-estar das mulheres e um avanço na luta contra a pobreza menstrual.
A Importância da Atualização e Participação dos Profissionais de Saúde
Para que a saúde menstrual seja abordada de forma eficaz, é essencial que os profissionais de saúde estejam constantemente atualizados sobre os mais recentes avanços e diretrizes neste campo. Isso inclui estar ciente das melhores práticas para o manejo de distúrbios menstruais, novos produtos menstruais disponíveis e estratégias educativas eficazes.
É crucial que os profissionais de saúde promovam narrativas que contribuam para quebrar o tabu em torno da menstruação. Isso significa falar sobre o tema de forma aberta e positiva, abordando a menstruação como um processo biológico natural e saudável. É crucial criar um ambiente onde os pacientes se sintam confortáveis para discutir suas preocupações menstruais sem vergonha ou constrangimento.
Além disso, os médicos e outros profissionais de saúde têm um papel vital na advocacia por políticas públicas que promovam a saúde menstrual. Participar de debates e fornecer insights baseados em evidências pode influenciar positivamente a formulação de políticas e programas de saúde.
Referências:
Hennegan J, Winkler IT, Bobel C, Keiser D, Hampton J, Larsson G, Chandra-Mouli V, Plesons M, Mahon T. Menstrual health: a definition for policy, practice, and research. Sex Reprod Health Matters. 2021 Dec;29(1):1911618. doi: 10.1080/26410397.2021.1911618. PMID: 33910492; PMCID: PMC8098749.
Kaur, Rajanbir; Kaur, Kanwaljit; Kaur, Rajinder (2018). “Menstrual Hygiene, Management, and Waste Disposal: Practices and Challenges Faced by Girls/Women of Developing Countries”. Journal of Environmental and Public Health. 2018: 1730964. doi:10.1155/2018/1730964. ISSN 1687-9805. PMC 5838436. PMID 29675047
BRASIL, MINISTÉRIO DA SAÚDE. Programa Dignidade Menstrual. https://www.gov.br/saude/pt-br/campanhas-da-saude/2024/dignidade-menstrual
https://www.menstrualhygieneday.org/about
BRASIL, PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. DECRETO Nº 11.432, DE 8 DE MARÇO DE 2023. Regulamenta a Lei nº 14.214, de 6 de outubro de 2021, que institui o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual.
UNESCO (2014). Puberty Education & Menstrual Hygiene Management – Good Policy and Practice in health Education – Booklet 9.
UNICEF e UNFPA. (2021). A Pobreza Menstrual Vivenciada Pelas Meninas Brasileiras. Disponível em: https://www.unicef.org/brazil/relatorios/pobreza-menstrual-no-brasil-desigualdade-e-violacoes-de-direitos.
