Na International AIDS Conference de 2024, foram apresentados os resultados do primeiro ensaio clínico utilizando técnicas de edição genética CRISPR para tratar HIV em humanos.
A EBT-101-001, um multiplex CRISPR/Cas9, foi considerada segura e bem tolerada, não gerando efeitos adversos graves nos pacientes que foram submetidos ao estudo. Porém, não foi possível prevenir a reativação viral.
CRISPR para tratar HIV (EBT-101-001): entenda como o estudo foi feito
Participaram do estudo seis pacientes, que foram divididos em dois grupos de acordo com a dose recebida: (1) 0,9 x 1012 genes vetoriais por quilo; e (2) 3 x 1012 genes vetoriais por quilo (grupo de alta dose).
A técnica CRISPR/Cas9 utiliza um RNA guia que tem como alvo o gene “defeituoso”, que será eliminado. No caso desse estudo, o alvo é o RNA do HIV, que se encontra dentro das células T CD4, as células vítimas da infecção viral.
Dos seis pacientes que participaram do estudo com CRISPR para tratar HIV, quatro deram prosseguimento a ele, e tiveram a interrupção dos seus medicamentos antirretrovirais 12 semanas após a infusão.
Dentre os indivíduos que não seguiram no estudo, um deles teve uma redução na contagem de LT CD4, o que impossibilitou sua permanência, e outro não atingiu a marca das 12 semanas após a administração da dose.
Nos participantes, os níveis de RNA do HIV se recuperaram após essa interrupção. Entretanto, em um paciente essa recuperação foi tardia e ocorreu após quase 16 semanas, acompanhada de uma queda significativa no reservatório viral. Ou seja, é preciso investigar o que aconteceu dentro do organismo desse paciente, visto que ele teve uma resposta mais positiva.
Além disso, outra característica positiva desse estudo é que o multiplex CRISPR/Cas9 foi capaz de atingir apenas a região pretendida, não agindo em outras regiões genômicas.
Nenhum dos participantes do estudo teve quaisquer eventos adversos graves, embora nove eventos adversos de baixo grau relacionados ao tratamento tenham se manifestado nos seis pacientes.
Demos mais um passo em direção à cura do HIV?
De acordo com a Dra. Rachel Presti, Ph.D., médica e diretora clínica da unidade de pesquisa clínica de doenças infecciosas da Washington University, nos Estados Unidos, os resultados apresentados da fase 1/2 “são um primeiro passo”.
A Dra. Chantelle Ahlenstiel, Ph.D., pesquisadora sênior em imunologia viral e patogênese no Kirby Institute na University of New South Wales, na Austrália, afirma que esse estudo é incrivelmente único, pois “foi um estudo de alto risco que mostrou um perfil de segurança muito promissor”.
Outro fato positivo foi que durante o período de interrupção dos medicamentos antiretrovirais, nenhum dos pacientes apresentou síndrome retroviral aguda. Segundo a Dra. Rachel, “Esses parâmetros exploratórios sugerem que pode ter havido algum efeito em pelo menos um participante, e estamos tentando avaliar o que havia de diferente naquela pessoa e como podemos aprimorar isso”.
“Acredito que, com os produtos da próxima geração de terapia, poderíamos obter um direcionamento mais eficiente do vetor e melhorar a especificidade da terapia também”, continuou.
Terapia gênica contra HIV: quais os próximos passos?
A Dra. Chantelle disse que o pequeno estudo mostrou “diminuições bastante variadas” no reservatório latente do HIV entre os participantes. Observou-se também que as duas sequências de RNA guia (gRNA) para CRISPR projetadas para o subtipo B apresentaram múltiplas incompatibilidades com as sequências do vírus do subtipo B em alguns dos seis participantes.
“Será importante conceber mais gRNAs que sejam altamente conservados em todos os subtipos de HIV, a fim de criar uma terapia genética do vírus aplicável globalmente”, disse ela.
É provável que as pessoas com um reservatório viral menor e mais simples, com tratamento antiretroviral consistente, tenham maior probabilidade de obter benefícios, disse a Dra. Rachel. “Isso se deve ao fato de que há menos variabilidade no reservatório e no sistema imunológico que precisam ser medidos e atingidos.”
Embora o fato de a terapia com CRISPR para HIV ter atingido apenas o seu alvo pretendido seja uma ótima notícia, os pacientes continuarão sendo acompanhados.
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Referências:
Primeiro ensaio em humanos de terapia gênica CRISPR para tratar o HIV – Medscape – 26 de agosto de 2024.
ClinicalTrials.gov ID NCT05144386. Study of EBT-101 in Aviremic HIV-1 Infected Adults on Stable ART.