Câncer de mama em mulheres negras: diferentes taxas de incidência e mortalidade
Apesar dos avanços na redução da taxa de mortalidade por câncer de mama, as mulheres afro-americanas apresentam um risco 40% maior de morrer em decorrência desta neoplasia em comparação às caucasianas.
Dentre as diversas razões para tal disparidade, podemos destacar uma incidência desproporcional de câncer de mama triplo-negativo (TNBC) nessa população, que sabidamente tem um prognóstico ruim e opções limitadas de tratamento.
Ainda, é importante destacar que as barreiras estruturais e socioeconômicas que são desiguais entre as diferentes populações. Afro-americanas com câncer (qualquer um, não apenas de mama) sofrem um impacto financeiro duas vezes mais significativo do que os pacientes caucasianos. Além disso, o acesso aos serviços de saúde e terapias de última geração contra TNBC metastático não é equivalente, o que aumenta os riscos em mulheres negras.
Alguns estudos também sugerem que mulheres negras com TNBC não metastático não menos propensas a receber tratamento cirúrgico ou quimioterápico, comparado às mulheres caucasianas. Esses achados também podem impactar diretamente nas taxas de mortalidade pela doença.
No mesmo sentido, os estudos clínicos são compostos em sua maioria por mulheres brancas, o que limita o desenvolvimento de terapias que atendam a todos. A variabilidade genética é um viés pouco avaliado nestes casos.
Com foco na oncologia de precisão, novos estudos indicam que o microambiente tumoral também tem um papel relevante nas diferenças de progressão tumoral, metástase e possibilidades de tratamento.
Diferentes microambientes tumorais, diferentes respostas terapêuticas
Alguns autores apontam que os resultados dos tratamentos são diretamente influenciados pelo microambiente tumoral (TME), e este pode diferir entre mulheres de diferentes ancestralidades.
Lembrando: o TME consiste na interação entre todos os componentes dentro do tumor e que afetam seu crescimento.
Mulheres negras e afro-americanas apresentam uma variação maior de componentes associados a efeitos tumorigênicos, como aumento dos níveis de citocinas pró-inflamatórias, macrófagos associados a tumores, quimiocinas e fator de crescimento endotelial vascular. Ainda, o aumento da densidade e vascularização pode facilitar o crescimento de tumores agressivos e metastáticos.
Outra questão importante que contribui para a disparidade entre neoplasias em mulheres de diferentes ancestralidades é a obesidade, conhecido fator que predispõe a diversas doenças, incluindo o câncer de mama.
A incidência de obesidade é maior em mulheres negras e afro-americanas em comparação com as caucasianas (49,6% vs. 42,2%). O maior número de adipócitos pode aumentar os níveis de resistina dentro do TME, o que resulta em ações oncogênicas. Além disso, pacientes obesos possuem maiores níveis de citocinas pró-inflamatórias, contribuindo para o processo de tumorigênese.
Nesse sentido, alguns pesquisadores sugerem que direcionar o tratamento para as moléculas altamente expressas dentro do TME possa ser uma possibilidade terapêutica para as mulheres com TNBC, e um benefício particular para as mulheres negras.
A perda de peso e a redução do risco de obesidade também podem ser benéficas – não só para a prevenção do câncer de mama, mas para a saúde em geral – visando a redução destes marcadores pró-tumorigênicos.
Câncer de mama quádruplo-negativo: risco ainda maior para mulheres negras
Já comentamos em um artigo anterior aqui no Portal sobre o câncer de mama quádruplo negativo (aqui). Grande parte dos casos de TNBC não apresenta expressão de receptor de andrógeno (AR).
Mulheres com câncer de mama subtipo triplo-negativo e afrodescendentes apresentam uma tendência maior em perder a expressão de AR. Esse subtipo é pouco sensível aos quimioterápicos convencionais, e não possui tratamento específico eficiente, apresentando pior prognóstico.
De toda forma, compreender a disparidade (celular e molecular) entre as diferentes pacientes com câncer de mama é fundamental para o desenvolvimento terapias objetivas, visando tratar as pacientes de forma mais eficaz e individualizada.
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Referências:
Zajac KK, Malla S, Babu RJ, Raman D, Tiwari AK. Ethnic disparities in the immune microenvironment of triple negative breast cancer and its role in therapeutic outcomes. Cancer Rep (Hoboken). 2023 Jan 12:e1779. doi: 10.1002/cnr2.1779. Epub ahead of print. PMID: 36632988.
Lopez R, Agullo P, Lakshmanaswamy R. Links between obesity, diabetes and ethnic disparities in breast cancer among Hispanic populations. Obes Rev. 2013 Aug;14(8):679-91. doi: 10.1111/obr.12030. Epub 2013 Apr 24. PMID: 23611507.
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