Doença de Alzheimer na Síndrome de Down: uma visão neuropatológica

Doença de Alzheimer na Síndrome de Down

Indivíduos adultos com a Síndrome de Down apresentam maior risco de Alzheimer, visto que a proteína precursora beta-amiloide é produzida no cromossomo 21. Entretanto, ainda não é certo se os mecanismos patológicos envolvidos com a Doença de Alzheimer na Síndrome de Down são os mesmos do que no Alzheimer na população em geral.

Uma pesquisa recente publicada na revista Nature Structural & Molecular Biology relatou a estrutura dos filamentos de Aβ e tau do cérebro de dois indivíduos com Síndrome de Down, a fim de entender se os mecanismos presentes na síndrome diferem dos mecanismos desenvolvidos na Doença de Alzheimer.

Qual a relação entre Síndrome de Down e Doença de Alzheimer?

A Síndrome de Down (SD) é o distúrbio cromossômico mais comum e mais conhecido em humanos, e a causa mais frequente de deficiência intelectual de origem genética, afetando cerca de 6 milhões de pessoas em todo o mundo.

A síndrome é causada pela presença de uma cópia extra total ou parcial do cromossomo 21 e, por isso, também é chamada de trissomia 21.

Indivíduos com SD são frequentemente diagnosticados com Doença de Alzheimer (DA) entre 55 e 60 anos e, às vezes, a partir dos 40 anos. E isso pode ser explicado pelo cromossomo 21 extra.

A triplicação do gene da proteína precursora do amiloide-β (AβPP), localizado no cromossomo 21, resulta na superprodução de AβPP na SD. Casos raros de SD que apresentam apenas trissomia parcial, excluindo o locus AβPP, mostram pouca ou nenhuma patologia do tipo DA, mesmo em idade avançada.

Duplicações no locus AβPP resultando em superprodução de AβPP em indivíduos sem SD foram relatadas em famílias com DA, apoiando fortemente o papel de Aβ na patogênese da DA na SD.

trissomias cromossômicas

 

Um pouco mais sobre a neuropatologia nessas condições

O fenótipo neuropatológico da DA observado em indivíduos com SD, que inclui deposição de Aβ (parenquimatosa e vascular) e emaranhados neurofibrilares (NFTs), é semelhante ao descrito em pacientes com DA; no entanto, variações entre a DA na SD e a DA causada por duplicações do locus AβPP foram relatadas, sugerindo que genes/fatores adicionais podem modular o desenvolvimento de Doença de Alzheimer na Síndrome de Down.

A maioria dos estudos neuropatológicos comparando DA e DA na SD tem se concentrado na caracterização de Aβ em placas amiloides e angiopatia amiloide cerebral (CAA), na propagação da patologia Aβ e tau e na presença de copatologias.

No parênquima cerebral, os peptídeos Aβ são o componente principal das placas senis e dos depósitos difusos. No compartimento vascular, a deposição de Aβ é encontrada nas paredes dos grandes e pequenos vasos leptomeníngeos, bem como nos vasos intraparenquimatosos de tamanho médio e pequeno.

Inclusões filamentares de tau ocorrem na forma de NFTs nos corpos celulares, em filamentos nos processos das células nervosas e em neuritos distróficos associados a placas de Aβ no córtex cerebral.

A caracterização recente por microscopia crioeletrônica (cryo-EM) da estrutura dos filamentos de Aβ e tau na DA e em distúrbios relacionados permite que os pesquisadores obtenham mais insights sobre as semelhanças e diferenças entre a DA e a DA na SD, comparando a estrutura dos filamentos de Aβ e tau entre os dois.

alzheimer e down

Na Doença de Alzheimer na Síndrome de Down, parece não haver predominância do tipo de filamento de Aβ encontrado

Os autores do artigo recente publicado utilizaram cryo-EM para caracterizar os filamentos de Aβ e tau extraídos dos cérebros de dois indivíduos com SD (sendo que a presença da patologia da DA em ambos os casos foi confirmada neuropatologicamente). Seu objetivo foi de realizar comparações entre as estruturas dos filamentos de Aβ e tau na Doença de Alzheimer versus Doença de Alzheimer na Síndrome de Down, fornecendo insights sobre os mecanismos patogênicos que podem levar à DA na SD.

As estruturas analisadas foram: (1) Filamentos do tipo I de Aβ42; (2) Filamentos do tipo II de Aβ42; (3) Filamentos do tipo III de Aβ42; e (4) Filamentos tau.

Os filamentos do tipo I de Aβ42 foram previamente relatados como o tipo predominante de filamentos em casos de DA esporádica, com abundante deposição parenquimatosa de Aβ na forma de placas centrais; enquanto os filamentos do tipo II de Aβ42 foram encontrados predominantemente em casos de DA familiar (mutações AβPP V717F e PSEN1 F105L), bem como em outras doenças neurodegenerativas.

Nos dois casos de Síndrome de Down avaliados no estudo, observou-se ambos os tipos de filamentos de Aβ42, presentes em níveis semelhantes. Na SD, a densidade e a morfologia das placas de Aβ podem ser semelhantes às observadas no Alzheimer esporádico; no entanto, diferenças regionais sutis na deposição de amiloide foram relatadas entre a Doença de Alzheimer na Síndrome de Down, DA esporádica e DA familiar.

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O acúmulo de Aβ pode ocorrer muito antes na Doença de Alzheimer na Síndrome de Down em comparação com Alzheimer esporádico

A deposição de Aβ ocorre muitas décadas antes na SD em comparação com a DA esporádica, com depósitos difusos sendo relatados em pessoas com SD entre 8 e 27 anos de idade. Foram estudados dois indivíduos com SD de 46 e 59 anos. Nesta idade, considera-se que o nível de deposição cortical de Aβ é semelhante ao observado na DA esporádica. Em ambos os casos, observou-se a presença de placas senis e depósitos difusos abundantes, contendo peptídeos Aβ42. O estudo de crio-EM mostra a presença de filamentos do tipo I e II de Aβ42, provavelmente refletindo a presença de placas centrais parenquimatosas e depósitos difusos nos dois indivíduos com DS.

A angiopatia amiloide cerebral (CAA) foi observada com frequências e severidades significativamente maiores nos cérebros de indivíduos com SD em comparação com casos de DA esporádica. Ambos os casos de SD mostraram CAA contendo peptídeos filamentos IIIa e IIIb de Aβ40. Mais pesquisas são necessárias para determinar se os filamentos de Aβ40 tipos IIIa e IIIb são únicos da SD ou se também estão presentes na CAA esporádica e na CAA associada à DA.

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Conclusão

Foram encontrados dois filamentos de Aβ40 (tipos IIIa e IIIb) que diferem daqueles previamente relatados na DA esporádica e dois tipos de filamentos de Aβ42 (I e II) idênticos aos encontrados na DA esporádica e familiar.

Os filamentos de tau (filamentos helicoidais emparelhados e filamentos retos) eram idênticos aos da DA, apoiando a noção de um mecanismo comum pelo qual os amiloides desencadeiam a agregação de tau.

Esse conhecimento é importante para entender a Doença de Alzheimer na Síndrome de Down e avaliar se adultos com a Síndrome de Down poderiam ser incluídos em ensaios clínicos de Doença de Alzheimer.

Doença de Alzheimer na Síndrome de Down

Referências:

FERNANDEZ, A. et al. Cryo-EM structures of amyloid-β and tau filaments in Down syndrome. Nature Structural & Molecular Biology, 2024. https://doi.org/10.1038/s41594-024-01252-3.

High-resolution images reveal similarities in protein structures between Alzheimer’s disease and Down syndrome. by Indiana University School of Medicine. March 29,2024. https://medicalxpress.com/news/2024-03-high-resolution-images-reveal-similarities.html

 

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