A infecção por HIV em recém-nascidos ocorre de maneira vertical e a identificação precoce permite um tratamento eficaz e uma redução das chances de progressão para AIDS. No entanto, poucos antirretrovirais estão disponíveis em formulações adequadas para neonatos, e há dados limitados de segurança e farmacocinética para a maioria deles.
Na busca por novas opções terapêuticas, um estudo recente publicado por um grupo brasileiro na revista The Journal of Infectious Diseases sugere a estimulação do próprio sistema imune no combate a infecção por HIV.
Infecção por HIV
O vírus da imunodeficiência humana (HIV) infecta as células do sistema imunológico humano, em especial linfócitos T CD4. Ao contrair o vírus, o indivíduo portador pode ter sua imunidade suprimida, uma vez que, as células T CD4 desempenham importante papel na imunidade humana.
Em um post anterior, falamos um pouco melhor sobre a interação do HIV com o hospedeiro.
Na maioria dos casos, os pacientes são assintomáticos nos primeiros meses. Uma vez a deficiência do sistema imunológico deixa o corpo mais suscetível a doenças oportunistas de ampla circulação, em uma investigação de uma gripe não resolvida pode se descobrir a infecção por HIV.
Em estáticas mais atualizadas, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estimou que cerca de 37.700.000 milhões de pessoas foram infectadas até 2020 – e cerca de 1,5 milhão de novos casos ocorreram apenas durante o ano avaliado. A infecção por HIV pode ser considerada uma doença epidêmica.
A doença começou a ser controlada principalmente após a disseminação de informações, em especial acerca de prevenção. Com o avanço da medicina, diversos medicamentos e estratégias terapêuticas têm sido utilizados para combater a infecção por HIV, proporcionando uma redução da carga viral.
No entanto, sabemos que o vírus ainda se encontra em lugares reservatórios, onde fica em estado latente. Dessa forma, os tratamentos antirretrovirais mantêm a doença controlada, fazendo com que os números de copias do vírus não seja detectável em exames de rotina, mas não levam a cura. Em caso de suspensão do uso, há recidiva da doença.
Aqui vale uma observação: falamos recentemente sobre um caso de uma paciente curada de forma espontânea do HIV. É o segundo caso já reportado na literatura. Caso não tenha conferido, vale a pena a leitura (disponível aqui).
Recém-nascidos não são tão imunodeficientes como se pensava
Um grupo de cientistas da Faculdade de Medicina da USP trouxe uma luz no tratamento (e possível cura) para o HIV.
Em um estudo recente publicado pelo grupo, os pesquisadores demonstraram in vitro que é possível potencializar a resposta imune de recém-nascidos, de forma que sejam mais eficientes em combater o vírus HIV.
Neste estudo os pesquisadores estimularam a resposta imune inata (ou seja, não específica a antígenos), a primeira linha de defesa do corpo humano. O estímulo ocorreu em células do cordão umbilical, por meio de um composto sintético nomeado de CL097.
Posteriormente a esta etapa, os pesquisadores incubaram estas células estimuladas com o vírus do HIV, e observaram respostas inflamatórias que auxiliavam na contenção da replicação do vírus.
Tal achado é empolgante pois, como já é de conhecimento da literatura, recém-nascidos, assim como idosos, possuem imunidade reduzida. No caso de recém-nascidos, em geral os monócitos, macrófagos e as células dendríticas secretam quantidade menores de citocinas – proteínas reguladoras da resposta imune e inflamatória.
Em comentário a agência Fapesp a autora principal do artigo Dra. Maria Notomi Sato diz “Os resultados reforçam o conhecimento que já tínhamos de que os recém-nascidos têm uma imunidade imatura, portanto, são mais suscetíveis a vírus como o HIV. No entanto, descobrimos que eles não são tão imunodeficientes quanto se imaginava, pois, suas células são capazes de responder muito bem a esse tipo de estímulo com agonistas de imunidade inata [substâncias que estimulam a primeira linha de defesa]. Um dos diferenciais do estudo foi o uso desse tipo de agonista [CL097], pois ele mimetiza o patógeno e permite reduzir a infecção viral”
Vale ressaltar que a infecção de bebês recém-nascidos ocorre de maneira vertical, ou seja, de uma mãe portadora para a criança. A identificação precoce de neonatos infectados com HIV e o início rápido do tratamento antirretroviral combinado durante o período neonatal são recomendados pela OMS. No entanto, poucos antirretrovirais estão disponíveis em formulações adequadas para neonatos, e há dados limitados de segurança e farmacocinética para a maioria deles.
Ainda que preliminar, o estudo pode servir de base para novos trabalhos e até mesmo ensaios clínicos futuros que aprimorem o tratamento do HIV, não só no Brasil como também no mundo.
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REFERÊNCIAS: