Não é novidade que estamos envelhecendo. Não apenas como indivíduos, mas como população – a expectativa de vida tem aumentado nos últimos anos. No início do século XX, essa expectativa era de 32 anos (inclusive, boa parte de nossa equipe do WeMEDS já estaria em seus últimos anos). Um pouco mais de um século depois, a expectativa de vida mais que dobrou.
Conforme a idade avança, a prevalência da Doença de Alzheimer na população também aumenta. Por essa razão, novas possibilidades terapêuticas e preventivas têm sido estudadas, e é sobre uma delas que vamos falar aqui.
Doença de Alzheimer
A doença de Alzheimer, um transtorno degenerativo progressivo, é caracterizada pela deterioração das funções cognitivas e de memória. Com a progressão da doença, as atividades diárias e as interações sociais do paciente vão ficando cada vez mais complicadas, uma vez que a parte física e comportamental são diretamente impactadas pelas alterações neurológicas.
Após muitos anos de estudos, pesquisadores ainda tentam desvendar todos os mecanismos por trás do surgimento e evolução dessa doença. Apesar de ainda não sabermos exatamente a causa de seu surgimento, alguns fatores de risco são bem conhecidos, como ser idoso, ser mulher, apresentar danos causados por traumas na cabeça, viver em ambiente pobre de estímulos, apresentar transtornos do sono, ter depressão, ser tabagista e alcoolista, ter obesidade, doenças cerebrovasculares, hipertensão entre outros.
Na maioria dos casos, o Alzheimer tem surgimento tardio, de acordo com o avanço da idade, mas também pode surgir cedo na história do paciente. O Alzheimer precoce familiar surge em pessoas com idade entre 30 e 65 anos e é causada por mutações genéticas na proteína precursora de amiloide, na presenilina 1 e na presenilina 2.
Já falamos um pouco sobre a Doença de Alzheimer em alguns outros posts aqui no Portal. Se quiser conferir, clique aqui.
Inclusive, em 2007, um livro de ficção sobre a doença de Alzheimer precoce familiar foi lançado. Escrito pela neurocientista Lisa Genova, o livro “Para Sempre Alice” (Still Alice) conta a história de Alice Howland, uma professora universitária (ironicamente da área de linguística) que é diagnosticada com Alzheimer precoce aos 50 anos. Ao longo do livro, podemos acompanhar os desdobramentos do avanço dessa doença, não só na vida pessoal e profissional de Alice, mas também na vida de seus três filhos e família.
Esse livro deu origem ao filme “Para Sempre Alice”, lançado em 2015 e que rendeu o Oscar de melhor atriz para Julianne Moore que interpreta Alice.
Impacto da Doença De Alzheimer
Voltando ao assunto…
De acordo com o relatório especial “2021 Alzheimer’s disease facts and figures”, cerca de 6,2 milhões de pessoas com mais de 65 anos vivem com Alzheimer atualmente nos Estados Unidos.
No Brasil, o cenário não é muito melhor: um estudo publicado em 2020 apontou que em 2016 aproximadamente 1,6 milhões de pessoas estavam vivendo com essa doença.
Levando em conta a estreita relação entre o avanço da idade e o desenvolvimento do Alzheimer, podemos imaginar que o número de pessoas acometidas por essa doença vem aumentado nos últimos anos e irá aumentar ainda mais nas próximas décadas. A verdade é que estamos ficando cada vez mais velhos!
E não dizemos isso de forma individual, estamos envelhecendo como população.
No início do século XX, a expectativa de vida era de 32 anos. Um pouco mais de um século depois, a expectativa de vida mais que dobrou. Segundo o IBGE 2019, a expectativa de vida do brasileiro durante esse ano, foi de 72,4 anos!
O aumento da expectativa de vida está intimamente ligado com o estilo de vida de cada um e os avanços da tecnologia e medicina.
Conforme a idade avança, a prevalência da doença de Alzheimer na população também aumenta. E com essa projeção de aumento no número de pessoas acometidas pela doença, vários grupos de pesquisadores ao redor do mundo, tem se debruçando sobre esse assunto, a fim de compreender melhor seus mecanismos fisiológicos, desenvolver métodos diagnósticos mais precisos e formas de tratamento mais eficazes, além de ir em busca da prevenção.
E foi pensando no desenvolvimento de novas possibilidades terapêuticas, que o grupo liderado pelo pesquisador Dr. Ahmad Sajjadi (University of California), divulgou seus dados no 146º Encontro Anual da American Neurological Association (ANA 2021) realizado em outubro deste ano.
Efeito dos anti-hipertensivos: mais uma faceta do Alzheimer
Esse trabalho foi realizado retrospectivamente, com dados obtidos através de autópsias e de cérebros doados ao National Alzheimer’s Coordinating Center e que compõem a base de dados dessa organização.
O chute inicial para a realização desse trabalho foi a polêmica em torno da associação entre hipertensão e doenças degenerativas. Portanto, esse grupo de pesquisadores objetivaram investigar não apenas a associação entre a hipertensão e a Doença de Alzheimer, mas também a relação da utilização de medicamentos anti-hipertensivos e a extensão dos danos neurológicos causados por essa doença.
Apesar de não serem capazes de observar uma correlação entre a hipertensão e as doenças neurológicas, a partir dos dados obtidos de 4.475 indivíduos com faixa etária média de 81 anos, os pesquisadores foram capazes de observar a redução nas alterações patológicas da Doença de Alzheimer e outras doenças neurológicas em pacientes que utilizavam medicamentos anti-hipertensivo para o tratamento da hipertensão.
Para que seus dados fossem incluídos no estudo, os pacientes tinham que apresentar histórico de hipertensão (≥ 130 mmHg; ≥ 80 mmHg; média da pressão arterial ≥ 100 mmHg; pressão de pulso ≥ 60 mmHg) e estarem submetidos à tratamento medicamentoso com anti-hipertensivos, como agentes antiadrenérgicos, inibidores da enzima conversora de angiotensina, terapia combinada, bloqueadores do receptor de angiotensina, betabloqueadores, bloqueadores de canais de cálcio, vasodilatadores e diuréticos.
Além de avaliar a presença de Doença de Alzheimer nesse grupo, também avaliaram outras neuropatologias, como angiopatia amiloide cerebral, corpos de Lewy, esclerose hipocampal, degeneração temporo-lombar e presença de proteína de ligação ao DNA TAR 43 (TDP-43).
Como resultados preliminares e iniciais, os pesquisadores observaram que a utilização de qualquer tipo de hipertensivo estava associado com a redução em 18% dos achados patológicos indicativos de Doença de Alzheimer, diminuição em 22% nos achados de corpos de Lewy e em 40% de TDP-43.
Dentro os medicamentos avaliados, os diuréticos apresentaram ter envolvimento mais robusto no desenvolvimento de doenças neurológicas, incluindo a Doença de Alzheimer.
Esse estudo, mesmo que ainda preliminar, pode ser um momento de virada nos estudos acerca da Doença de Alzheimer, uma vez que sugere um papel importante dos medicamentos anti-hipertensivos como protetor cerebral, reduzindo o risco de desenvolvimento de doenças neurodegenerativas em pessoas com hipertensão.
Vamos ficar de olho onde esse caminho irá nos levar!
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Referências:
José Eustáquio Diniz Alves. Esperança de vida diante da emergência sanitária e climática